Malformações congénitas do aparelho respiratório
Introdução
Definição
As malformações congénitas do aparelho respiratório podem afetar as vias aéreas, o parênquima e os vasos pulmonares, resultando de um desenvolvimento embrionário anormal. O diagnóstico pré-natal é possível com a ecografia obstétrica e a ressonância magnética fetal. Ainda assim, podem só ser diagnosticadas após o aparecimento de sintomas respiratórios ou acidentalmente num exame imagiológico. São muito variáveis na sua apresentação clínica, terapêutica e prognóstico.
Epidemiologia
Estima-se que a incidência seja de 1 em 10.000-35.000 nados-vivos.
História Clínica
A tabela 1 resume as principais malformações congénitas do aparelho respiratório, respeitando a nova nomenclatura (ex. malformação congénita das vias aéreas pulmonares corresponde à antiga designação de malformação adenomatóide quística).
Tabela 1: Principais Malformações Congénitas do Aparelho Respiratório
Malformação Congénita |
Patologia | Clínica | Diagnóstico | Diagnóstico Diferencial |
Laringomalácia |
Malformação congénita mais comum das vias aéreas superiores. |
RN/lactente: estridor (que se intensifica com as IR e o choro), SDR, dificuldades alimentares |
Clínico Laringoscopia Broncoscopia |
Estenose sub-glótica Quistos da laringe Estenose traqueal |
Traqueomalácia e Broncomalácia |
Colapso dinâmico da parede da traqueia ou do brônquio durante a respiração. Pode ser 1ª (ex. deficiência de cartilagem) ou 2ª (ex. compressão por vaso anómalo). |
RN: SDR, estridor Lactente: SDR, estridor, sibilância, tosse, IR |
Broncoscopia (em respiração espontânea) TC tórax (com broncoscopia virtual) |
Estenose brônquica |
Quisto Broncogénico |
A partir do divertículo respiratório numa fase inicial da embriogénese. |
RN: SDR e dificuldades alimentares se quistos grandes Infância/ adolescência: tosse, estridor, sibilância, IR, disfagia |
Rx tórax (massa arredondada, desvio do mediastino) TC tórax (massa mediastínica quística, com densidade hídrica) |
Linfadenopatia Neuroblastoma Quisto dermóide |
Agenesia, Aplasia e Hipoplasia Pulmonar |
Agenesia (unilateral): ausência da carina; traqueia termina num brônquio. |
RN: SDR Infância/ adolescência: IR, SDR, redução da capacidade pulmonar, assimetria torácica, escoliose |
Rx tórax (na agenesia e na aplasia há herniação do pulmão, desvio do mediastino) TC tórax |
Na agenesia e aplasia:
Na hipoplasia:
|
Sequestro Pulmonar
|
Parênquima pulmonar não funcionante, com ausência de normal comunicação com VAP e suprimento arterial da circulação sistémica. |
RN: maioria assintomático Infância/ adolescência: tosse, IR, hemoptises, toracalgia No sequestro extralobar a maioria é assintomático |
Ecografia obstétrica (vascularização anómala) Rx tórax (hipotransparência) TC e angio-TC tórax |
MCVAP Hérnia diafragmática Quisto broncogénico |
Enfisema Lobar Congénito
|
50% tem causa desconhecida; 25% por deficiência de cartilagem ou por obstrução brônquica. Há colapso das VAP e hiperinsuflação lobar (air trapping). |
RN: SDR ou assintomático Infância: SDR, sibilância, IR, má progressão ponderal |
Ecografia obstétrica Rx tórax (hipertransparência lobar e desvio do mediastino) TC tórax Broncoscopia |
MCVAP Pneumotórax Sequestro pulmonar Quisto broncogénico |
Malformação Congénita das Vias Aéreas Pulmonares
|
Crescimento displásico das VAP terminais com formação de quistos que impendem crescimento alveolar circundante. Tipo 0: todo pulmão (incompatível com a vida) |
RN: SDR, morte por hidrópsia ou hipoplasia pulmonar Infância: SDR, IR, pneumotórax (tipo 4), transformação maligna (tipo 4 e possível no tipo 1) |
Ecografia obstétrica Rx tórax (quistos arredondados, preenchidos por secreções ou ar) TC e RMN tórax |
Sequestro pulmonar Hérnia diafragmática Quisto broncogénico Enfisema lobar congénito |
Angio-TC – angiografia por tomografia computorizada; BPP – blastoma pleuropulmonar; DPN – diagnóstico pré-natal; IR – infecção respiratória; LSE – lobo superior esquerdo; LIE – lobo inferior esquerdo; MCVAP – malformação congénita das vias aéreas pulmonares; RMN – ressonância magnética; RN – recém nascido; Rx – radiografia; SDR – síndrome de dificuldade respiratória; TC – tomografia computorizada; VAP – vias aéreas pulmonares.
Tratamento
Na laringomalácia e na traqueo-broncomalácia o tratamento é habitualmente conservador. Nas restantes malformações a maioria dos casos requer intervenção cirúrgica (lobectomia parcial ou total), como é exemplo o quisto broncogénico, o sequestro pulmonar intralobar e a malformação congénita das vias aéreas pulmonares, por melhorar o crescimento pulmonar e diminuir a probabilidade de complicações (infeções respiratórias e malignização). Nalgumas situações, como o sequestro pulmonar extralobar ou o enfisema lobar congénito, a decisão de uma abordagem cirúrgica passa pela presença de sintomas respiratórios.
Evolução
Na laringomalácia e na traqueo-broncomalácia o prognóstico é geralmente bom com resolução espontânea dos sintomas aos 6-24 meses de idade. No quisto broncogénico, a excisão cirúrgica previne as complicações a longo prazo. Na agenesia unilateral direita a mortalidade é maior pelas alterações cardíacas associadas. A hipoplasia pulmonar associa-se em 50% dos casos com outras malformações (cardíacas, gastrointestinais). No sequestro pulmonar o prognóstico é bom, com poucas complicações pós-operatórias. No enfisema lobar congénito há associação com malformações cardíacas em 14% dos casos. Na malformação congénita das vias aéreas pulmonares o prognóstico é bom no tipo 1 e 4 se excisão cirúrgica da lesão; no tipo 2 depende das malformações associadas (atrésia esofágica); o tipo 3 tem mau prognóstico pelo envolvimento multilobular.
Recomendações
Todas as malformações diagnosticadas no período neonatal devem ser confirmadas imagiológicamente após o nascimento, pois nalguns casos poderá ocorrer regressão da lesão. Após a confirmação da lesão, a decisão terapêutica depende da equipa multidisciplinar (cirurgia e pneumologia pediátrica).
Bibliografia
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- Hysinger EB, Panitch HB. Paediatric Tracheomalacia. Paediatr Respir Rev 2016; 17:9.
- Fowler DJ, Gould SJ. The pathology of congenital lung lesions. Semin Pediatr Surg 2015; 24:176.
- Montasser Nadeem, Basil Elnazir, and Peter Greally, “Congenital Pulmonary Malformation in Children,” Scientifica, vol. 2012, Article ID 209896, 7 pages, 2012. doi:10.6064/2012/209896
- Baird R, Puligandla PS, Laberge JM. Congenital lung malformations: informing best practice. Semin Pediatr Surg 2014; 23:270.
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