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Introdução

Regressão na criança mais velha e no adolescente

Também neste grupo etário é necessário considerar que regressão pode não ter uma causa genética.

Nos sindromas com actividade epiléptica contínua a idade de início é bastante variável, em geral entre os 3 e os 7 anos. OEEG «define» estes síndromas epilépticos e mostra actividade epileptiforme focal na vigilia com uma marcada acentuação e difusão durante o sono (a actividade paroxística ocorre em mais de 80% do tempo passado em sono não REM). O síndroma de Landau-Kleffner além destas características electroencefalográficas manifesta-se por uma perda rapidamente progressiva e global da linguagem, perturbação do comportamento e crises ocasionais, frequentemente parciais e ocorrendo no sono. No síndroma de ponta-onda continua no sono a regressão é predominantemente comportamental e traduz-se por um comportamento hipercinético e irritável associado a disfunção executiva.

Panencefalite esclerosante subaguda do sarampo deve ser sempre considerada no diagnóstico diferencial de regressão num contexto em que exista sarampo endémico e em que a criança tenha uma história pessoal prévia compatível com esta infecção. Ocorre mais frequentemente após sarampo contraído numa idade precoce. O período de latência é variável (vários anos a décadas). Após uma fase inicial demencial, inespecifica, o doente manifesta crises de tipo mioclónico e ataxia, mais tarde uma tetraplegia espástica com sinais extrapiramidais que evolui para um estado vegetativo. O EEG torna-se na 2ª fase (mioclónico-atáxica) bastante útil para o diagnóstico mostrando complexos periódicos de ondas abruptas e amplas com intervalos de 4 a 10 segundos.

Outra etiologia infeciosa de regressão que deve ser considerada é a encefalopatia HIV. Raramente, observam-se casos de infecção adquirida na adolescência. As manifestações iniciais de encefalopatia HIV são semelhantes ás do adulto: perturbação do humor de tipo depressivo, défice das funções executivas, dificuldades mnésicas.

Doença psiquiátrica pode ter alguns sintomas cognitivos simuladores de demência. Depressão major pode manifestar-se no adolescente por apatia, falta de energia e de motivação e por alguns sintomas cognitivos, como dificuldades de concentração e de memória. Em geral uma perturbação persistente do humor favorece o diagnóstico de depressão. Na Esquizofrenia uma disfunção cognitiva minor e não progressiva afectando sobretudo as funções executivas pode ocorrer no entanto os sintomas negativos e sobretudo positivos (delírio e alucinações) conduzem a este diagnóstico.

Doença mitocondrial: em geral a suspeita de doença mitocondrial baseia-se na presença de sintomas e sinais não neurológicos (baixa estatura, surdez, diabetes mellitus, diabetes insipida, cardiomiopatia) e neurológicos (demência, atrofia óptica, oftalmoplegia externa progressiva, ataxia, distonia, neuropatia, miopatia, enxaqueca, epilepsia). Os padrões de transmissão são múltiplos: autossómica dominante e recessiva, ligada ao X e mitocondrial, existindo também casos esporádicos. O lactato sérico e a alanina podem estar elevados. A biópsia de músculo pode mostrar um défice quantitativo de componentes da cadeia respiratória. Além do estudo bioquímico, o estudo genético (do DNA mitocondrial e de genes nucleares envolvidos na manutenção e replicação do DNA mitocondrial ou na síntese ou agregação de componentes da cadeia respiratória) pode permitir obter um diagnóstico etiológico. Ultrapassa o âmbito deste trabalho uma descrição detalhada dos múltiplos fenótipos. Kearns-Sayre, MELAS, MERRF e Leber são fenótipos resultantes de mutações no DNA mitocondrial. É necessário considerar estes diagnósticos em crianças mais velhas e adolescentes.

Doença de Wilson é uma doença do metabolismo do cobre. Ocorre uma acumulação de cobre no fígado, na córnea e no cérebro. Além de anemia hemolítica, doença hepática e doença renal, existe um quadro neurológico que pode inicialmente ser isolado. Tremor grosseiro, distonia (axial, dos membros e facial), ataxia e uma perturbação psiquiátrica de tipo psicótico são as principais manifestações. O anel de Kaiser-Fleischer resulta de depósitos de cobre na córnea e está sempre presente quando há doença de Wilson neurológica. Ceruloplasmina diminuída e aumento da excreção urinária de cobre orientam para o diagnóstico assim como uma RM mostrando hipersinal estriatal e no mesencéfalo. O estudo do gene ATP7A confirma o diagnóstico.

Adrenoleucodistrofia ligada ao cromossoma X é habitualmente uma doença que se manifesta na criança em idade escolar. Ocorre inicialmente uma deterioração cognitiva e comportamental em que se salientam agnosia visual e mais tarde auditiva e subsequentemente uma disfunção motora atáxico-espástica evoluindo para o estado vegetativo. O nível de ácidos gordos de cadeia muito longa está elevado. Frequentemente insuficiência supra-renal coexiste com ou antecede o quadro neurológico e manifesta-se por hiperpigmentação cutânea. A RM mostra uma desmielinização posterior com a particularidade de captação de contraste na periferia. O estudo genético confirma este diagnóstico.

Doença de Huntington é uma doença degenerativa autossómica dominante resultante de uma mutação no gene HD em que ocorre expansão de uma repetição de tripletos. Sendo mais frequente o inicio na idade adulta pode ter início na adolescência e mesmo na infância e manifestar-se por demência, psicose, parkinsonismo e, por vezes, epilepsia. Coreoatetose («coreia de Huntington») ocorre mais tardiamente nestes casos sendo contudo paradigmática da forma do adulto. Em TAC e RM é aparente atrofia progressiva dos núcleos caudado e lenticular (putamen).

Lipofuscinose na forma juvenil manifesta deterioração visual, epilepsia e demência. A biópsia de pele demonstra depósitos de lipopigmento.

Sialidose tipo 1 («cherry red spot myoclonus») tem como principais sintomas uma deterioração visual associada a ataxia, mioclonias e demência num adolescente. O défice de neuraminidase é responsável por este quadro clínico.

Do que expusemos anteriormente sobressai que o diagnóstico destas doenças é complexo e exige experiência nesta área e a conjugação de dados clínicos, imagiológicos e laboratoriais. A raridade e a multiplicidade de etiologias fazem com que por vezes possa ser difícil e demorado chegar a um diagnóstico.

No Reino Unido um estudo epidemiológico sobre regressão psicomotora em crianças e adolescentes («Progressive Intelectual and Neurologic Deterioration») revelou como mais frequentes os seguintes diagnósticos: mucopolissacaridose tipo 3-Sanfilippo-, Adrenoleucodistrofia ligada ao X, Lipofuscinose Infantil Tardia (CLN2), doença mitocondrial e síndroma de Rett. É possível contudo que estas conclusões estejam influenciadas pela «composição genética» desta população e que a realidade noutros países possa ser diferente, sabendo-se que em determinadas populações a presença de certos genes patológicos de doenças neurodegenerativas é consideravelmente maior.

Completamos esta descrição com imagens de alguns achados típicos de Ressonância Magnética/TAC/EEG em doenças metabólicas/degenerativas e em algumas doenças infeciosas com regressão psicomotora

  1. Leucodistrofia metacromática
  2. Adrenoleucodistrofia ligada ao cromossoma X
  3. Doença de Wilson
  4. Distrofia neuroaxonal
  5. Doença de Leigh
  6. Acidúria glutárica tipo 1
  7. Mucopolissacaridose tipo III (Sanfilippo)
  8. Panencefalite esclerosante subaguda EEG
  9. Encefalopatia HIV

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