Balanite e Balanopostite
Introdução
A balanite (inflamação da glande do pénis) e a postite (inflamação do prepúcio) são entidades muito semelhantes, pelo que o termo balanopostite é o mais utilizado, exceto em crianças circuncidadas. Nestas, a postite já não é aplicável, exceto se existir um remanescente prepucial (raro).
Frequência
A balanopostite é uma situação frequente entre os 2 e os 5 anos, embora também possa surgir em adolescentes e adultos. A prevalência varia entre 12-20%, independentemente da idade. Nas crianças, atinge cerca de 4-8% das não circuncidadas e 3% das circuncidadas.
História Clínica
Causas
- A higiene genital deficitária secundária à presença de fimose fisiológica é a etiologia mais comum das balanopostites inespecíficas em idade pediátrica. A fimose facilita a acumulação de esmegma e de resíduos urinários, os quais aumentam o risco de sobreinfeção.
- Infeções: fúngicas (Candida albicans) são mais frequentes em lactentes com dermatite da fralda ou crianças com uso recente de antibióticos; bacterianas (Staphylococcus e Streptococcus) ou víricas (herpes, HPV), incluindo alguns agentes causadores de infeções sexualmente transmissíveis (ISTs), mais comuns em adolescentes.
- Irritantes químicos (produtos de higiene) podem fomentar inflamação cutânea local em crianças com pele atópica.
- Trauma: a retração forçada do prepúcio e o atrito provocado pelas roupas ou pela relação sexual podem lesionar a região genital e constituir uma porta de entrada para microrganismos.
Anamnese
O diagnóstico da balanopostite é clínico e baseia-se na caraterização dos sintomas, no reconhecimento de fatores precipitantes e na realização de um exame objetivo sumário, com maior enfoque na região genital.
É fundamental questionar a presença e duração dos principais sintomas:
- Dor/desconforto ao mobilizar o prepúcio ou ao urinar
- Prurido, eritema e edema da glande e/ou do prepúcio
- Secreções penianas purulentas
- Úlceras ou escoriações da glande
- Maior irritabilidade ou desconforto em lactentes
- Incapacidade em urinar/retenção urinária aguda que pode estar associada a sintomas de infeção urinária (ITU).
O profissional de saúde deve aferir se existem antecedentes de alergias, quais os hábitos de higiene diários adotados, assim como esclarecer a utilização de novos produtos potencialmente irritantes.
Deve questionar acerca do uso recente de medicação e, no caso dos adolescentes que já iniciaram atividade sexual, avaliar se utilizam proteção adequada.
Esclarecer se existe alguma patologia ou tratamento recente que predisponha a imunossupressão, nomeadamente diabetes ou doenças auto-imunes e aferir se se trata do primeiro episódio de balanopostite ou se esta já costuma ser uma situação recorrente.
Exame objectivo
É indispensável inspecionar a glande e o prepúcio e avaliar a presença de edema, eritema, lesões da mucosa, secreções penianas ou celulite. Determinar a existência de fimose e a sua gravidade, pois a parafimose constitui uma emergência cirúrgica.
Se existir retenção urinária aguda associada a estenose do meato uretral (balanite xerótica obliterante), pode ser urgente o esvaziamento vesical.
Diagnóstico Diferencial
Os principais diagnósticos diferenciais de balanopostite em idade pediátrica incluem:
- ITU: presença de disúria, polaquiúria, urgência miccional e/ou febre, sem aparentes sinais inflamatórios locais;
- Dermatite de contato/eczema: secundária a lavagem genital com produtos irritantes, mais frequente em crianças com antecedentes de atopia;
- Dermatite da fralda em lactentes;
- Líquen plano: doença inflamatória de provável causa imunológica com manifestações na pele, mucosas genitais e orais;
- Líquen escleroso (balanite xerótica obliterante): condição inflamatória crónica com placas esbranquiçadas na região genital;
- Psoríase: lesões corporais dispersas, avermelhadas com bordos bem definidos e descamação;
- Uretrite: evidência de secreções penianas associadas a sintomas urinários;
- Erupção medicamentosa fixa: é rara, mas o pénis é uma das áreas corporais mais afetadas. Os precipitantes incluem anti-inflamatórios não esteróides, paracetamol e antibióticos.
Exames Complementares
Crianças
Na suspeita de ITU, deve ser realizado exame de urina com urocultura e na presença de exsudado ureteral devemos solicitar exame cultural para excluir ISTs e a possibilidade de abuso sexual. Caso contrário, é feito tratamento empírico com base no diagnóstico clínico.
Nesta faixa etária, as etiologias mais comuns incluem candidíase associada a dermatite da fralda, balanopostite inespecífica secundária a higiene inadequada e/ou fimose e balanopostite de contato. A erupção fixa do medicamento é rara, diagnosticada com base numa exposição prévia ao fármaco suspeito.
Adolescentes
Em adolescentes, a coloração de Gram e o cultural de secreções são úteis para identificar infecções por S. aureus e anaeróbios.
Ponderar realização de cultura de Streptococcus do Grupo A (se faringite, história de contato oro-genital ou doença persistente), cultura fúngica (se antecedentes de diabetes com achados sugestivos de infeção fúngica) e pesquisa de ISTs (se sexualmente ativos).
Tratamento
Independentemente da etiologia subjacente à balanopostite, os cuidados de higiene são fundamentais. Está preconizada a realização de banhos com água salina morna pouco concentrada, pois têm um efeito calmante, aliviam a dor, ajudam na higienização, reduzem o edema local e a concentração de urina, facilitando a saída do jato urinário. Se possível, o prepúcio deve ser retraído, sem forçar, para estimular a saída de secreções acumuladas.
O tratamento específico depende da etiologia subjacente:
- Bacteriana: nos casos ligeiros está recomendado antibiótico tópico (ex: creme de mupirocina 2%, bacitracina ou neomicina) 3 vezes/dia, durante 7-10 dias e/ou antibiótico tópico associado a corticóide (betametasona + gentamicina), 2x/dia durante 7-10 dias.
- Fúngica: indicado antifúngico tópico (creme miconazol 0,25% aplicado a cada muda de fralda ou clotrimazol 1%, 2x/dia durante 7-14 dias).
- Irritativa/alérgica: evicção de alergénios e de lavagem genital excessiva, utilizar produtos de higiene íntima adequados, incluindo um emoliente diário. A hidrocortisona tópica 1% pode ser aplicada numa fina camada 2x/dia durante 1-2 semanas.
- Inespecífica: o tratamento consiste em medidas gerais de limpeza genital suave, com produtos adequados. Na presença de fimose fisiológica, a retração forçada do prepúcio deve ser evitada. É expectável que à medida que a criança cresce o prepúcio fique mais retrátil e facilite a limpeza. Se isso não acontecer e, nos casos de balanopostites recorrentes, deverá ser ponderada a prepucioplastia ou, mais raramente, a circuncisão.
Nas balanopostites secundárias/associadas a ITU, ISTs ou outras doenças dermatológicas, o tratamento deve ser individualizado de acordo com o protocolado para a causa principal. Adicionalmente, poderão ser prescritos analgésicos e/ou anti-inflamatórios para alívio do desconforto e inflamação locais. Os antibióticos orais devem ser instituídos quando existe celulite, ITU ou IST, estas últimas comprovadas laboratorialmente.
Na retenção urinária, poderá haver necessidade de realizar esvaziamento vesical no Serviço de Urgência, com a alta assegurada apenas após nova micção espontânea. Crianças com parafimose requerem avaliação urgente por Cirurgia Pediátrica, pois existe compromisso do fluxo sanguíneo do pénis e risco de necrose.
Evolução
A maioria das balanopostites são condições benignas e auto-limitadas, com ótimo prognóstico e baixo risco de complicações após tratamento adequado.
Em crianças com doença prolongada/refratária à terapêutica, recorrência de sintomas ou com fimose grave, com possível associação a situações de obstrução urinária, a prepucioplastia/circuncisão deve ser considerada como medida terapêutica definitiva.
Em alguns casos, a decisão individualizada de realizar biópsia deve ser discutida em conjunto com o profissional de saúde.
Nas infeções recorrentes, é primordial a investigação e exclusão de patologias como diabetes, doenças imunológicas ou neurológicas, nomeadamente disfunções vesicais.
Recomendações
É fundamental promover uma higiene genital adequada, pois esta constitui uma medida terapêutica e preventiva da maioria das balanopostites em idade pediátrica. Associadamente, é crucial alertar as crianças e os progenitores para, se existir fimose fisiológica, evitarem a retração forçada do prepúcio, assim como sabonetes desadequados.
Em situações de balanopostite recorrente, a prepucioplastia/circuncisão pode ser terapêutica, contudo é imperativa uma avaliação por Cirurgia Pediátrica.
Bibliografia
- Protocolos de urgência em pediatria / ed. António Levy Gomes... [et al.]. - 4ª ed. - Lisboa : ACSM Editora, imp. 2019.
- Tews M, Wilcox D. Balanitis and balanoposthitis in children and adolescents: Clinical manifestations, evaluation, and diagnosis. UpToDate; 2024 [consultado em Setembro 2024]. Disponível em: https://www.uptodate.com/contents/balanitis-and-balanoposthitis-in-chil…
- Perkins OS, Leslie SW, Cortes S. Balanoposthitis. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2024 Jan- [updated 2024 May 6; Consultado em setembro 2024. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books.
- Edwards SK, Bunker CB, van der Snoek EM, van der Meijden WI. 2022 European guideline for the management of balanoposthitis. J Eur Acad Dermatol Venereol. 2023;37(6):1104-1117. doi:10.1111/jdv.18954.
- Tews M, Wilcox D. Balanitis and balanoposthitis in children and adolescents: Management. UpToDate; 2024 [consultado em Setembro 2024]. Disponível em: https://www.uptodate.com/contents/balanitis-and-balanoposthitis-in-chil…
Deseja sugerir alguma alteração para este tema?
Existe algum tema que queira ver na Pedipedia - Enciclopédia Online?