Oftalmologia Pediátrica - rastreio, seguimento e referenciação
Introdução
Definição
A Oftalmologia Pediátrica constitui uma área da Oftalmologia aplicada ao rastreio, diagnóstico e tratamento das doenças oculares das crianças e adolescentes.
A visão tem um papel essencial no desenvolvimento da criança como um todo, uma vez que constitui a via de entrada da maior parte do conhecimento relativo ao meio ambiente que a rodeia, sendo responsável por cerca de 80% de toda a informação captada.
Ao nascermos o sistema visual está presente com toda a sua estrutura pronta a funcionar. Os olhos, as vias ópticas e o córtex visual estão presentes, mas não suficientemente desenvolvidos a ponto de integrar e segmentar a informação visual. A sua maturação só se faz com a experiência visual dada pelo estímulo luminoso, desenvolvendo-se a percepção do movimento, a orientação, a cor, a fusão, a disparidade binocular, a percepção tridimensional. Estas são competências complexas, não só do sistema visual em si, mas também do sistema nervoso central que se iniciam com o nascimento e se prolongam ao longo dos primeiros 10 anos de vida. Qualquer anomalia que interfira neste processo terá sequelas a longo prazo.
O desenvolvimento da função visual a nível do cérebro exige um estímulo visual apropriado e depende do bom funcionamento dos olhos durante o período em que o cérebro tem plasticidade para aprender a ver. Este período em que a visão pode desenvolver-se designa-se período crítico e, uma vez ultrapassado este período, mesmo que as alterações oculares sejam corrigidas, não é possível obter melhoria na visão. O período crítico varia com as diferentes funções visuais, por exemplo é diferente para o desenvolvimento da visão cromática, para o desenvolvimento da acuidade visual ou para o desenvolvimento da binocularidade e estereopsia. Sabemos que a plasticidade do córtex visual vai diminuindo com a idade podendo os períodos críticos que são de duração variável, prolongarem-se até aos 6 -7 anos, ou serem muito curtos como no caso de opacidade dos meios e obstrução do eixo visual por cataratas congénitas nomeadamente unilaterais, e assim expirarem nos primeiros meses de vida. Isto significa que a janela de oportunidade para o tratamento pode ser muito reduzida sendo premente o diagnóstico precoce.
O exame oftalmológico da criança permite não só a avaliação da função visual, como também diagnosticar a presença de doenças sistémicas e/ou alterações do desenvolvimento, sua relação com a saúde geral e, se são específicas deste grupo etário, exigindo uma abordagem sistémica diferenciada.
Frequência do rastreio e seguimento
No primeiro ano de vida o rastreio pode ser efectuado pelos pediatras e médicos de família sendo importante aquando do nascimento a observação atenta para detecção de eventuais alterações na forma ou na transparência dos meios oculares ou nos movimentos oculares
A partir dos três meses de idade adiciona-se a avaliação da fixação e perseguição de faces, luz e objectos que se executa nesta altura com facilidade e deverá fazer parte do exame sistémico do bebé.
A partir dos seis meses de idade deverá ser feita também a avaliação do alinhamento ocular e dos movimentos oculares fazendo a oclusão de cada um dos olhos para verificar se respondem os dois olhos do mesmo modo.
Entre um e três anos de idade o rastreio oftalmológico que habitualmente pode ser realizado pelo pediatra / médico de família deverá se possível ser preferencialmente efectuado por médico oftalmologista constituindo assim um rastreio mais completo. Esta referenciação embora ideal, é facultativa.
Aos três a quatro anos de idade o rastreio oftalmológico é obrigatório e deverá ser efectuado idealmente por médico por oftalmologista.
Entre os cinco a seis anos o rastreio oftalmológico é novamente obrigatório e deveria ser efectuado por médico oftalmologista.
A periodicidade das avaliações oftalmológicas posteriores em consulta de oftalmologia variam individualmente conforme a patologia oftalmológica e/ou sistémica, sendo que, quando esta não foi detectada ou não existem condições familiares sistémicas ou oftalmológicas específicas, o rastreio deverá ser efectuado preferencialmente de dois em dois anos.
A valorização da função visual pelo pediatra / médico de família
O papel do pediatra e ou do médico de família é muito importante na detecção e encaminhamento na área oftalmológica e a referência a consulta de oftalmologia poderá prevenir deficiência oftalmológica a longo prazo pela detecção precoce de patologia oftalmológica que interfira com o processo de aquisição da imagem comprometendo um normal desenvolvimento do sistema visual ou mesmo sinalizar patologias locais ou sistémicas que poderão por em causa a vida e o desenvolvimento do indivíduo.
A avaliação oftalmológica é especialmente importante se existe história familiar de doença ocular, se a criança é prematura, se tem alterações neurológicas, dismorfias faciais, doenças genéticas ou metabólicas, ou doenças reumatológicas.
Sinais e sintomas
Sinais e sintomas que podem alertar os cuidadores
Antes de um ano de idade:
- Tumefacções palpebrais, oculares ou noutras localizações perioculares
- Meios não transparentes com opacidades, pupila branca.
- Pálpebra descaída
- Não segue o rosto da mãe, ou o biberão.
- Lacrimeja muito.
- Parece entortar os olhos.
- Reage com intensidade à luz tapando os olhos ou desviando o olhar.
Depois de um ano de idade:
- Tem dificuldade significativa ao caminhar e ao subir escadas.
- Aproxima muito os objectos.
- Parece estrábico.
- Inclina a cabeça para fixar os objectos.
- Esfrega muito os olhos.
- Tem “tiques” oculares.
- Reage com intensidade à luz tapando os olhos ou desviando o olhar.
Depois dos quatro anos de idade:
- Queixa-se de dores de cabeça.
- Tem muita dificuldade em distinguir as cores.
Depois dos 6 anos de idade:
- Não vê bem ao longe.
- Não lê bem.
O que fazer
O exame oftalmológico na criança
Acuidade visual
Por vezes o envio a consulta de Oftalmologia é retardado pois existe a ideia errada de que não se consegue avaliar correctamente a acuidade visual em crianças pequenas. A acuidade visual pode ser medida em qualquer idade, mesmo em crianças que ainda não falam. O método é que pode exigir diferente complexidade consoante essa idade. Nas crianças mais velhas podem ser usadas figuras, símbolos, jogos, e a leitura de números ou letras. Nas crianças mais novas ou não colaborantes a avaliação pode ser feita de modo qualitativo e ainda podem ser utilizados exames complementares que permitem a avaliação indirecta da acuidade visual.
Reflexos pupilares
Facilmente pesquisados pela incidência de uma luz sobre as pupilas revelam o funcionamento do sistema nervoso que serve o aparelho visual.
Alinhamento dos olhos e visão binocular
São usados vários métodos e testes consoante a idade e a colaboração da criança para verificar o alinhamento dos olhos e certificar que os músculos que fazem mover os olhos estão funcionando normalmente. Isto pode ser feito utilizando reflexos luminosos ou cobrindo alternadamente cada olho para ter a certeza que os olhos estão alinhados e fazendo as medições com prismas ou com a ajuda de aparelhos específicos. Os testes da visão binocular são usados para verificar não só que os olhos estão bem alinhados, mas também que o cérebro os está a usar bem e simultaneamente.
Refracção
O erro refractivo é quantificado por um método objectivo a cicloscopia. A refracção é usada para medir a “força” do olho e determina se a criança é hipermétrope, míope, ou se tem astigmatismo. Isto pode ser feito em crianças que não colaboram o suficiente para nos dizer como estão a ver. Uma luz especial é dirigida para os olhos e movimentada em várias direcções e sentidos. O modo como o médico recebe a reflexão dessa luz permite medir o poder refractivo do olho. Nas crianças mais novas o elevado poder de focagem do olho jovem deve ser eliminado de modo a realizar a medição sem erro. Para isso são colocadas gotas nos olhos para dilatar a pupila e anular o mecanismo de focagem. Estas gotas levam cerca de 30 minutos a fazer efeito sendo utilizados diferentes colírios que podem ser colocados durante a consulta ou em casa antes da consulta.
O exame do segmento anterior dos olhos
A observação para detecção de alterações morfológicas dos segmentos anteriores pode ser facilmente efectuada em crianças de todas as idades com o auxílio de um biomicroscópio portátil ou fixo conforme a colaboração e a idade da criança.
É possível medir a pressão intraocular nas crianças com vários tipos de aparelhos chamados tonómetros colocando apenas colírios anestésicos e corantes tópicos. Contudo nos bebés e em crianças pequenas ou não colaborantes nomeadamente com suspeita de glaucoma congénito ou infantil esteja indicada a medição sob anestesia geral.
O exame do fundo do olho
O médico usa uma luz especial, muitas vezes colocada na sua cabeça, e uma lente, para olhar para dentro do olho da criança. Os vasos sanguíneos da retina, a retina e a porção ocular do nervo óptico podem ser observados directamente, o que é muito útil para ajudar a diagnosticar doenças oftalmológicas ou sistémicas que se reflectem naquelas estruturas. Também para esta observação é necessário dilatar a pupila (midríase) com o auxílio de colírios.
Após o exame oftalmológico
Uma vez terminado o exame oftalmológico a criança poderá precisar de usar óculos ou outras formas de tratamento poderão ser prescritas. O médico oftalmologista indicará o modo de uso da correcção óptica, o tipo de armações e lentes mais adequadas á idade e a frequência das reobservações.
Se a criança colocou gotas poderá ter a visão enevoada até o efeito ter passado. A duração deste efeito depende do tipo de colírios usados, do poder refractivo dos olhos e do próprio indivíduo.
Tratamento
A equipa que cuida do sistema visual da criança
Um Oftalmologista é um médico que se especializou em doenças oculares. O Oftalmologista Pediátrico é um oftalmologista com experiência comprovada em cirurgia e medicina do sistema visual das crianças e adolescentes
Um Técnico de Ortóptica é especificamente treinado para fazer exames ou tratamentos prescritos pelo Oftalmologista sendo um profissional que está também envolvido com bastante regularidade no tratamento da criança.
Um Óptico, um Optometrista, orientam a montagem das lentes e armações prescritas, testando se solicitado.
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