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Introdução

As proteínas de transferência de lípidos (Lipid Transfer Proteins -LTP) constituem uma família de polipéptidos de origem vegetal com funções cruciais na defesa das plantas. Estas proteínas destacam-se pela sua termoestabilidade e resistência à digestão com pepsina, tornando-se, por isso, alergénios robustos que mantêm a sua atividade tanto em alimentos crus quanto cozinhados

Estão presentes em frutas, como o pêssego, alperce, mas também, em nozes, sementes, legumes e cereais. A maioria do seu conteúdo concentra-se na casca e nas sementes. O Pru p 3 (pêssego) foi uma das primeiras LTP a ser identificada. É prevalente no Sul da Europa, com estudos a estimarem a sensibilização em cerca de 11% dos adultos e 22% das crianças em Espanha. 

A sensibilização a Pru p 3 tende a manifestar-se precocemente nas crianças, associando-se a um início sintomático mais precoce do que outras proteínas, como as associadas ao pólen (Pru p 1 ou Pru p 4). 

No contexto mediterrânico, as LTP são uma das principais causas de alergia alimentar e de anafilaxia mediada por IgE.

História Clínica

A apresentação clínica da criança com síndrome de LTP varia consoante o grau de sensibilização à proteína e o alimento envolvido. 

As reações graves podem ocorrer na presença de fatores de risco como a ingestão de anti-inflamatórios não esteróides (aspirina ou ibuprofeno), situações de stress, ingestão de álcool ou exercício físico, que podem potenciar a resposta alérgica. 

Os sintomas mais comuns incluem:

  • Reações locais (síndrome de alergia oral): Prurido, angioedema dos lábios, língua e orofaringe, com início minutos após a ingestão de alimentos que contêm LTP, como pêssego, alperce, amêndoa, avelã ou nozes. Este quadro é mais comum em adolescentes e adultos.  
  • Manifestações cutâneas: rash urticariforme de início rápido. 
  • Sintomas gastrointestinais: Dor abdominal, náuseas, vómitos e diarreia.
  • Anafilaxia: Nos casos mais graves, pode ocorrer urticária generalizada, angioedema, broncoespasmo e choque anafilático.

A história clínica deve focar-se na relação temporal entre o consumo de alimentos e o início dos sintomas, bem como a ocorrência de reações a múltiplos alimentos relacionados com LTP. Devemos suspeitar quando ocorrem reações após consumo de pêssego ou a frutos com casca. 

Diagnóstico Diferencial

O diagnóstico da síndrome de LTP pode ser desafiante, dada a sobreposição com outras alergias alimentares e reações mediadas por IgE ou outros mecanismos. 

  • Síndrome de Alergia Oral: Embora também envolva prurido oral e edema após a ingestão de frutas, a síndrome de alergia oral é geralmente associada a sensibilização ao pólen, e não às LTP. Este síndrome está associado a outros marcadores como Bet v 1, Bet v 2, Pru p 1 e Pru p 4. 
  • Alergia a outras proteínas de armazenamento: Comum em nozes e sementes, podendo causar reações graves semelhantes.
  • Outras alergias alimentares: Inclui frutos secos, mariscos ou proteína do leite, que também podem causar anafilaxia.  
  • Anafilaxia induzida por exercício: Em alguns pacientes, o consumo de alimentos ricos em LTP seguido de prática de exercício físico pode desencadear reações graves.

Exames Complementares

O diagnóstico de sensibilização à LTP baseia-se na história clínica e em exames de alergia específicos. As ferramentas diagnósticas incluem:

  • Testes cutâneos por picada (Prick Test): É um método simples e rápido. Corresponde à avaliação de sensibilização através de extratos alimentares ou LTP recombinante. Os testes com uso de frutas e vegetais frescos (prick-to-prick) demonstraram ser mais sensíveis do que o uso de extratos comerciais. 
  • Doseamento de IgE específica: Determinação dos níveis de IgE contra LTP específicas, como Pru p 3 e de profilinas (Pru p 1 e Pru p 4). 

O ImmunoSorbent Allergen Chip (ISAC) – 112 contem 9 tipos de LTP, para além do Pru p 3, tem 3 componentes das nozes (Ara h9, Cora a 8, Jug r 3), um cereal (Tri a 14) e 4 poléns LTP (Art v 3, Ole e 7, Pla a 3 e Par j2). O grau de reatividade a estas LTP está relacionado com a gravidade dos sintomas. 

A presença, em simultâneo de Pru p 1 e Pru p 3 parece diminuir o risco de reações alérgicas severas. 

  • Prova de provocação oral: Considerado o método gold-standard para confirmação diagnóstica, são sempre realizados sob supervisão médica em meio hospitalar, devido ao risco de anafilaxia. Apenas são realizados se existirem dúvidas de diagnóstico ou para avaliar a tolerância. 

Tratamento

O tratamento da síndrome de LTP requer uma abordagem multifacetada, que envolve:

  • Evicção alimentar: A evicção de alimentos que contêm LTP é a primeira linha de tratamento. Alimentos como pêssego, ameixa, alperce, avelã, amêndoa, nozes devem ser evitados nos pacientes sensibilizados.
  • Evitar o uso de utensílios contaminados com estes alimentos. 
  • Adrenalina auto-injetável: Os pacientes com risco de reações anafiláticas devem ser instruídos a utilizar um auto-injetor de adrenalina e trazê-lo consigo em todas as situações.
  • Anti-histamínicos e corticosteróides: São indicados para reações alérgicas ligeiras a moderadas.
  • Imunoterapia oral: Embora ainda em fase de investigação, a imunoterapia com LTP pode, no futuro, ser uma estratégia terapêutica viável para dessensibilizar os pacientes, embora o seu uso deva ser cuidadosamente monitorizado. 

Evolução

O prognóstico dos pacientes com alergia mediada por LTP é variável. Em muitos casos, a evicção rigorosa dos alimentos desencadeantes é suficiente para prevenir novas reações. No entanto, reações cruzadas com outros alimentos que contenham LTP são possíveis. 

Além disso, a gravidade das reações pode aumentar ao longo do tempo. Os pacientes com reações iniciais leves devem ser alertados para o risco de desenvolvimento de anafilaxia.

Recomendações

A prevenção de reações alérgicas relacionadas com a LTP baseia-se essencialmente na educação do paciente e das famílias. As principais recomendações incluem:

  1. Identificação dos alimentos alergénicos: A família do doente e o doente devem ser instruídos sobre os alimentos que contêm LTP e as possíveis reações cruzadas com outros produtos.
  2. Há alimentos que contêm LTP mas se estiverem a ser tolerados pelas crianças, pode-se manter a ingestão. Contudo, deve-se evitar os alimentos a que a criança reagiu, bem como os de maior risco e os que ainda não ingeriu se for posterior à reação. 
  3. Utilização correta do autoinjetor de adrenalina: É fundamental a correta utilização do dispositivo, que deve estar sempre acessível. O uso de anti-histamínico e corticoide oral também deve ser recomendado nas reações leves a moderadas. 
  4. Evitar consumo de alimentos relacionados em contextos de risco: As crianças devem evitar alimentos alergénicos em locais com acesso médico limitado.

Saber Mais

Síndrome LTP – Alergia alimentar – Anafilaxia 

Bibliografia

  1. Lozano J, Quevedo SJ, Piquer M. Alergia a frutos secos. Alergia a legumbres y frutas. Alergia a pescados y mariscos. Protoc diagn ter pediatr. 2019;2(1):237-258. www.aeped.es/protocolos/
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