Introdução
Definição
Síncope é definida como perda súbita do conhecimento e do tónus postural, habitualmente transitória e de curta duração. Pode ser precedida por pródromos (pré-sincope) caracterizados habitualmente por sensação de fraqueza, vertigem, sudurese ou alterações visuais.
O mecanismo subjacente relaciona-se com um período transitório de hipoperfusão cerebral e a recuperação é habitualmente breve, espontânea e completa.
Epidemiologia
É frequente em idade pediátrica especialmente na adolescência (15-20% das crianças e adolescentes terá pelo menos um episódio de síncope).
Etiologia
Na maioria dos casos é benigna mas em raros casos pode estar associada a patologia grave, nomeadamente do foro cardíaco, com risco de morte súbita. A abordagem diagnóstica deve, por isso, ser detalhada com elevado grau de suspeição.
Causas frequentes, benignas
Síncope neurocardiogénica
A mais frequente causa de síncope em idade pediátrica. O mecanismo subjacente consiste na diminuição súbita da pressão arterial e frequência cardíaca por alterações na regulação do tónus vasomotor por resposta reflexa paradoxal do sistema nervoso autónomo. Pode acompanhar-se de movimentos tónico-clónicos de curta duração por hipoperfusão cerebral (>15-20 segundos), com recuperação habitualmente espontânea e completa.
Síncope vasovagal - mais frequente na adolescência, desencadeada por estímulos físicos (dor, calor, desidratação, ortostatismo prolongado) ou psíquicos (ansiedade, medo – colheita de sangue)
Hipotensão ortostática - associada a mudança brusca para posição ortostática.
Espasmo do choro – associado a um episódio de choro intenso desencadeado por medo, dor ou stress com perturbação da ventilação e perda de conhecimento. Cessa no inicio da idade escolar.
Síncope situacional - em situações particulares tais como micção, defecação, deglutição, tosse.
Causas raras, graves, potencialmente fatais (2-6% casos)
Cardiopatia congénita ou adquirida com síncope secundária a compromisso hemodinâmico.
Perturbação do ritmo cardíaco - Síndrome do QT longo e Síndrome QT curto; Síndrome de Brugada, Taquicárdia polimórfica familiar, Displasia arritmogénica do Ventriculo direito, Disfunção do nódulo sinusal, Bloqueio auriculo-ventricular, Síndrome Wolf Parkinson White etc.
Lesão estrutural / Obstrutiva - Cardiomiopatia hipertrófica, estenose aórtica, coartação da aorta, pericardite constritiva
Disfunção Miocárdica - Miocardiopatia dilatada, miocardite, isquémia, etc.
História Clínica
Anamnese
História clínica detalhada + Exclusão prioritária de causas graves
Pesquisar fatores desencadeantes:
- Desidratação, ortostatismo ou elevação prolongada dos membros superiores, stress físico ou emocional (dor/ medo), alterações posturais bruscas, micção, dejecção, tosse, choro : síncope neurocardiogénica.
- Durante exercício físico: causa cardíaca (arritmia)
- Após exercício físico: síncope neurocardiogénica (vasovagal por pooling venoso)
- Situações atípicas!
- estímulo sensorial intenso (ex: alarme): taquicárdia ventricular catecolaminérgica;
- stress físico ou emocional: Síndrome QT longo
Sintomatologia associada:
- Tonturas, alterações visuais, náusea, palidez, ansiedade ou stress: síncope vasovagal
- Palpitações, dor precordial: causa cardíaca - neurocardiogénica / ansiedade
- Movimentos tónico-clónicos após o início da crise: causa cardíaca (arritmia), neurocardiogénica
- Fome, fraqueza muscular, tremor e sudorese: hipoglicémia
Antecedentes pessoais relevantes:
- Antecedentes de cardiopatia estrutural ou funcional;
- Consumo de fármacos (vasodilatadores, diuréticos, perturbação do QT), substâncias ilícitas ou exposição a tóxicos
- Caracterização dos ciclos menstruais (gravidez, anemia)
Antecedentes familiares relevantes:
- Cardiomiopatia (hipertrófica ou dilatada)
- História de síncope, caracterização dos episódios
- Morte súbita em idade jovem (
- Arritmias conhecidas (perturbação do QT, S. Brugada, WPW)
Exame objectivo completo, com especial atenção:
- FC, TA e sua variação posicional (descida 20mmHg e/ou aumento 20 bpm ao levantar): hipotensão ortostática
- Diferencial TA membros superiores e inferiores (>20mmHg): CoAo
- Sons cardíacos (S3, S4, ritmo de galope), sopros e variação com posição, clicks, atritos.
- Alteração ao exame neurológico, avaliação de eventuais traumatismos.
Diagnóstico Diferencial
- Causas neurológicas - Lesão SNC (vascular, massa), epilepsia, enxaqueca.
- Causas metabólicas - hipoglicémia, alterações hidroeletrolíticas.
- Perturbação psiquiátrica - histeria, perturbação da ansiedade, pânico e hiperventilação
- Intoxicações medicamentosas ou aditivas - antidepressivos tricíclicos, barbitúricos, fenotiazidas, álcool, cocaína, marijuana, exposição a CO, etc…
Exames Complementares
ECG 15 derivações
- Primeira linha em todos os doentes
- Pode sugerir doença cardíaca grave: ausência de ritmo sinusal, bloqueio AV completo, perturbação do QT; padrão de Brugada, ondas épsilon (displasia arritmogénica VD), onda delta e pré excitação (WPW), hipertrofia VE : (obstáculo esquerdo).
Tilt test
- Alta especificidade (90%) e baixa sensibilidade (65-75%) para síncope vasovagal.
- Episódios recorrentes sugestivos de etiologia vasovagal ou atípicos com a restante investigação inconclusiva; para tranquilizar a família.
Avaliação analítica
- Gasimetria arterial ou venosa (distúrbios metabólicos ou da ventilação), glicémia, hemograma, beta-HCG, pesquisa substâncias ilícitas ou tóxicos, etc.
Avaliação cardiológica
- Ecocardiograma transtorácico, Holter 24h, Prova de esforço
- Se suspeita de cardiopatia estrutural ou arritmia a partir dos achados anteriores (incluindo história familiar)
- Síncope vasovagal recorrente sem resposta ao tratamento empírico.
Avaliação neurológica
- EEG
- Quando sugestivo de causa neurológica: perda de conhecimento e período pós crítico prolongados, crises convulsivas desde o início do episódio, alterações neurológicas ao exame objectivo;
- TCE significativo.
Tratamento
A orientação terapêutica é sempre dirigida à causa.
Deve ser dado especial ênfase ao esclarecimento, tranquilização e ensino da criança e da família.
Medidas gerais de prevenção da síncope vasovagal:
- Reconhecimento dos sinais e sintomas de alarme: adoptar precocemente posição decúbito com elevação membros inferiores ou sentado (aumento retorno venoso e perfusão cerebral), pedir ajuda; Posicionamento de segurança no caso de síncope: decúbito lateral.
- Reforço hídrico e salino;
- Evicção de posições estáticas prolongadas
- Evicção de locais muito aquecidos (piscinas interiores, saunas, etc…)
Critérios de internamento:
- Episódios atípicos: necessidade de reanimação, perda de conhecimento prolongada
- Evidência de cardiopatia grave: arritmia, insuficiência cardíaca, cianose, precordialgia
- Evidência de lesão neurológica
- Síncope postural refratária ás medidas gerais de prevenção da síncope vasovagal.
Evolução
Na maioria dos casos a evolução é tendencialmente para a remissão completa dos episódios sendo o prognóstico muito favorável dado que maioritariamente são de carácter benigno, Porém, em cerca de 35% dos casos pode haver recorrência dos episódios de síncope. Os raros casos potencialmente graves, nomeadamente de causa cardíaca, terão um prognóstico tanto mais favorável quanto mais precocemente diagnosticados e tratados.
Recomendações
- Reconhecimento dos sinais e sintomas de alarme: adoptar precocemente posição decúbito com elevação membros inferiores ou sentado (aumento retorno venoso e perfusão cerebral), chamar por ajuda; Posicionamento de segurança no caso de síncope: decúbito lateral.
- Reforço hídrico e salino.
- Evicção de posições estáticas prolongadas.
- Evicção de ambientes muito aquecidos (saunas, piscinas interiores).
Bibliografia
- UpToDate: Emergent Evaluation of syncope in children and adolescents, January 2014
- UpToDate: Causes of syncope in children and adolescents, December 2013
- Park MP. Park´s Pediatric Cardiology for Practitioners. Fourth Edition. Philadelphia: Elsevier Saunders; 2010.
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