Infecção de origem hospitalar
Introdução
Definição
Infecção de origem hospitalar (IH) ou infecção nosocomial é qualquer infecção que surge 72 horas depois da admissão do doente no hospital e que não estava em incubação quando este foi admitido.
Epidemiologia
As taxas de IH variam de acordo com as características dos doentes, do tipo de doença, do tipo de hospital e da enfermaria onde estão internados. São mais frequentes em unidades de queimados e em cuidados intensivos neonatais. Na população de RN de extrema prematuridade pode atingir os 60%. Por outro lado, enquanto no adulto a IH mais frequente é a urinária, na criança é a sépsis, a sépsis associada com cateter venoso central e a pneumonia associada ao tubo traqueal.
Uma criança com internamento de curta duração incluindo o RN de termo saudável com alta às 36h ou 48h de vida, é suposto não adquirir IH.
As IH condicionam aumento de consumo de antimicrobianos, maior tempo de internamento e morbilidade e mortalidade acrescidas.
QUADRO CLÍNICO
Apresentação clínica
Os sinais e sintomas de uma IH não diferem de uma outra qualquer infecção. É mais o contexto do aparecimento desses sinais que leva à suspeição de IH. Doente internado há mais de 72 horas que surge com febre, aspecto séptico, recusa alimentar, dificuldade respiratória, tosse, agravamento radiológico, necessidade de ventilação de novo ou, se ventilado, necessidade de aumento dos parâmetros de ventilação, são forte motivo de suspeita de IH. Dependendo do tipo de microrganismo em causa o início pode ser insidioso – caso do Staphylococcus coagulase negativa ou, pelo contrário, fulminante – caso do Staphylococcus aureus ou de bactérias de Gram negativo, muitas vezes multirresistentes ou produtoras de betalactamases de espectro estendido - não dando tempo a intervenção terapêutica eficaz em tempo útil.
Exame objectivo
O exame objectivo deve ser minucioso e orientado pela história clínica e suspeita diagnóstica. Devem ser pesquisados clinicamente focos de infecção localizados em órgãos profundos e de acordo com o contexto – endocardite, pielonefrite, meningite, artrite ou osteomielite, muitas vezes ausentes no início do quadro clínico mas com possibilidade de instalação se o inicio da terapêutica for protelado ou não adequado ao microrganismo. Se o doente tiver sido submetido a intervenção cirúrgica prévia deve admitir-se a possibilidade de infecção do local cirúrgico superficial, de espaço ou de órgão.
Diagnóstico Diferencial
No período neonatal deve ser feito diagnóstico diferencial de IH com infecção de origem materna em recém-nascidos internados em unidades de cuidados intensivos neonatais por períodos prolongados. A infecção de origem materna pode surgir até muito tarde, nomeadamente a sépsis por Streptrococcus do grupo B que se considera poder surgir até aos 3 meses. Provavelmente poderá acontecer o mesmo com infecção causada por E. coli. No doente mais crescido é por vezes difícil ver claramente que não estava em período de incubação de uma infecção da comunidade nomeadamente uma infecção respiratória, quando foi admitido por outra razão, pelo que o contexto epidemiológico é fundamental.
Exames Complementares
Patologia Clínica
Os exames culturais são fundamentais para comprovar o diagnóstico e orientar a terapêutica. Os produtos para exames culturais devem ser colhidos antes do início da terapêutica. Hemoculturas – 2 periféricas ou uma periférica e outra através do cateter se for o caso; cultura de pus colhido de modo asséptico de preferência por punção com agulha após desinfecção da pele; urinocultura; cultura do líquor cefalorraquidiano (LCR) se houver suspeita de meningite; pesquisa de vírus dependendo do contexto epidemiológico e dos sinais clínicos e sintomas. Devem também ser pedidas análises para avaliar a repercussão sistémica da infecção que podem servir para controlo da eficácia terapêutica: hemograma, proteína C reactiva e/ou velocidade de sedimentação e, de acordo com o doente ou a gravidade da situação clínica, ionograma, função renal, gasimetria, urina tipo II, exame citoquímico do LCR.
Imagiologia
Os exames imagiológicos serão pedidos de acordo com a hipótese diagnóstica: radiografia de tórax na suspeita de pneumonia, ecografia abdominal, renal, cardíaca, transfontanelar, das partes moles, de acordo com o órgão alvo da suspeita de infecção ou foco; eventual ressonância magnética ou tomografia axial computorizada ou ainda cintigrafia. Nos grandes pré-termo com cateter venoso central, internamento prolongado, sujeitos a vários cursos de antibioticoterapia e em nutrição parentérica, a quem não foi prescrita profilaxia para infecção fúngica, deve suspeitar-se de infecção por fungos pelo que além dos exames descritos atrás, é fundamental pedir exame do fundo do olho. O pedido de exames deve ser escalonado e discutido com os profissionais das diferentes áreas.
Tratamento
Cirurgia
A drenagem cirúrgica está indicada nos abcessos, artrites ou outras infecções com colecção de pus.
Antibioterapia
Os antibióticos devem ser prescritos de acordo com a sensibilidade das bactérias que mais frequentemente causam infecção na unidade ou enfermaria onde o doente está internado. Se se suspeita de infecção causada por Staphylococcus aureus e as estirpes isoladas na enfermaria forem habitualmente resistentes à meticilina deve começar-se com vancomicina; caso contrário devo iniciar a terapêutica com flucloxacilina. O mesmo com as enterobacteriáceas. Se a estirpe habitualmente isolada for sensível ás cefalosporinas de 3ª geração é por aí que se deve começar. Mas se é sabido que habitualmente são resistentes ou produtoras de betalactamases de espetro estendido deve começar-se com um antibiótico do grupo dos carbapenemos.
Evolução
A evolução e o prognóstico dependem muito da rapidez do diagnóstico e da instituição de terapêutica adequada. Em pediatria é raro o óbito por IH mesmo em unidades de cuidados intensivos neonatais onde estão os doentes mais vulneráveis. Isto é devido ao facto do agente mais frequente da infecção hospitalar nestes doentes ser causado por Staphylococcus coagulase negativa, de baixa patogenicidade. É mais frequente o óbito por IH ocorrer em contexto de surto de infecção com bactérias multirresistentes em que a primeira criança doente é a mais grave, e em que o diagnóstico e o inicio da terapêutica adequada são mais demorados.
Recomendações
A prevenção da infecção hospitalar é uma obrigação de todos os profissionais de saúde. A medida isolada mais eficaz no controlo de IH é a lavagem das mãos. Ver capítulo “Prevenção da Infecção Hospitalar”.
Bibliografia
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