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Introdução

A escarlatina é uma doença infeciosa aguda causada por Streptococcus pyogenes do grupo A e em raros casos por Streptococcus do grupo C, D e G.

Na maioria das vezes associa-se a amigdalite/faringite, contudo, também pode ser secundária a infecção cutânea (impétigo).

Epidemiologia

A sua incidência tem aumentado nos últimos anos. É mais frequente entre os cinco e os 10 anos e rara no período neonatal e primeiro ano de vida devido a presença de anticorpos maternos.

Atinge ambos os sexos e apresenta um pico de incidência nos meses de inverno e primavera.

História Clínica

Anamnese, exame objectivo

Na fase prodrómica, entre as 12 e as 24h, a criança pode apresentar apenas sintomas inespecíficos tais como febre, odinofagia, cefaleias, astenia, anorexia, mialgias, náuseas, vómitos e dor abdominal.

Posteriormente, surge um exsudado amigdalino purulento e adenopatias cervicais que se associam a uma língua branca com papilas gustativas protuberantes que, progressivamente, se tornam edemaciadas e avermelhadas (língua em framboesa).

Cerca de 24 a 48h depois, surge um exantema micropapular disperso, áspero ao toque que desaparece com a digitopressão. Este exantema inicia-se na face e pescoço, apresenta uma progressão cefalocaudal com atingimento do tronco e membros, poupando as palmas e plantas. Caracteriza-se pela presença de palidez perioral (sinal de Filatov) e linhas transversais mais evidentes nas flexuras (sinal de Pastia).

Cerca de 1 semana após o início dos sintomas, surge uma descamação fina na face e tronco que posteriormente atinge as mãos e os pés de forma mais intensa (descamação em meia e luva).

Exame objectivo

 A escarlatina caracteriza-se pela presença de febre associada a exsudado amigdalino purulento, adenopatias cervicais e língua em framboesa. O exantema maculopapular disperso pelo tronco que poupa a região perioral (sinal de Filatov) e que é mais intenso na zona das flexuras (sinal de Pastia) é característico da escarlatina.

Numa fase mais tardia, após desaparecimento dos restantes sinais clínicos, pode ser observada uma descamação fina da face, tronco e membros, bem como uma descamação mais intensa nas mãos e pés (descamação em meia e luva).

Diagnóstico Diferencial

Amigdalite vírica ou bacteriana causada por outras bactérias (ex: Staph. aureus, Hem. influenza, N. gonorrhoeae, Mycoplasma pneumoniae, Clamydia pneumoniae…)

Outras doenças exantemáticas, tais como: sarampo, rubéola, exantema infecioso, doença de Kawasaki, etc.

Exames Complementares

Patologia Clínica

O diagnóstico de escarlatina é clinico com a observação da tríade febre, amigdalite/faringite e exantema maculopapular disperso.

Pode ser efetuada a pesquisa de SGA na orofaringe com a realização de zaragatoa para confirmação do agente etiológico. A presença de SGA na orofaringe pode ser realizado por teste diagnóstico antigénico rápido (TDAR) e/ou por cultura da zaragatoa da orofaringe. O TDAR permite um resultado rápido, com uma especificidade elevada (>95%), contudo apresenta uma sensibilidade bastante variável (80 e 90%).

Por outro lado a cultura da zaragatoa da orofaringe é o único teste que permite a realização do antibiograma. Contudo, os resultados só estão disponíveis 24 a 48 horas depois, o que constitui uma grande limitação. Tem uma sensibilidade de 90-95% e uma especificidade de aproximadamente 99%. Um TDAR positivo em doentes sintomáticos é diagnóstico de infeção por SGA e não precisa de ser confirmado por cultura, dada a sua elevada especificidade.

Tratamento

No tratamento da escarlatina o controlo sintomático é um dos pilares fundamentais podendo ser realizado com recurso a antipiréticos e analgésicos (paracetamol e ibuprofeno).  

Antibioterapia

A antibioterapia na escarlatina é essencial no tratamento e na prevenção de complicações. Os antibióticos beta-lactâmicos são o tratamento de eleição devido a sua elevada eficácia e segurança aliada a um baixo custo. A antibioterapia de primeira linha na escarlatina é:

  • Amoxicilina, via oral, 50 mg/Kg/dia (máx. 1g / dia), de 12/12 horas ou
  • Penicilina G benzatínica, via intramuscular, em dose única de 50.000 unidades (U) por Kg, ou seja, 600.000 U se peso

Nas crianças com reação de hipersensibilidade não tipo 1 à penicilina o antibiótico de eleição é:

  • Cefalosporina de 1ª geração: ex: Cefadroxil, via oral, 30 mg / kg / dia, 24 / 24 horas (máx. 1 grama/dia), ou
  • Cefalosporina de 2ª geração: ex: Cefuroxime-axetil, via oral, 20-30 mg / kg / dia, 12/12 horas (máx. 1 grama / dia) ou o cefeprozil, via oral, 15 a 30 mg / kg / dia, 12 / 12 horas (máx. 2 grama/dia).

Perante antecedentes de reação de hipersensibilidade tipo 1 à penicilina (anafilaxia, broncospasmo, angioedema e urticária) recomenda-se administração de:

  •  Claritromicina via oral, 15 mg / kg / dia, 12/12 horas, máx 500 mg / dia ou
  •  Eritromicina via oral, 50 mg / kg / dia, 6 / 6 ou 8 / 8 horas, máx 2000 mg / dia ou
  •  Azitromicina via oral, 12 mg / kg/ dia, 24 / 24 horas, máx 500 mg / dia ou
  •  Clindamicina via oral, 20 mg / kg / dia 8 / 8 horas, máx. 1,8 g / dia.

A duração do tratamento antibiótico recomendado na escarlatna é de 10 dias, excepto no tratamento com Azitromicina que é de 5 dias ou na administração de Penicilina G benzatínica em que apenas é necessária uma administração.

A evicção escolar é recomendada até completar pelo menos 24h de antibiótico (Decreto Regulamentar n.º 3/95, de 27 de janeiro).

Algoritmo clínico / terapêutico

Evolução

Na maioria das vezes a escarlatina evolui favoravelmente após início de antibioterapia com regressão progressiva da sintomatologia. Em raros casos, podem surgir complicações precoces e tardias.

As complicações precoces ou supurativas ocorrem durante a fase aguda da doença e resultam da disseminação da infeção estreptocócica local a outros locais do organismo (ex.: otite, sinusite, laringite, meningite, etc.).

As complicações tardias ou não supurativas surgem semanas após o desaparecimento da sintomatologia e englobam a febre reumática e a glomerulonefrite. Estas são complicações potencialmente graves que têm vindo a diminuir a sua incidência devido ao tratamento adequado e atempado da escarlatina.

O início de antibioterapia nos primeiros três dias de doença, permite encurtar a duração da sintomatologia e erradicar o SGA da orofaringe em 24 horas. O atraso do início da terapêutica até aos 9 dias de doença, não aumenta o risco de febre reumática.

Recomendações

A escarlatina é uma doença altamente contagiosa, transmitida por via aérea em contacto próximo com o doente infetado. O período de contágio varia entre 10 e 21 dias nos doentes não tratados e 24h nos doentes tratados. Assim a evicção escolar é recomendada até completar pelo menos 24h de antibiótico.

Recomenda-se ainda higiene frequente das mãos e a não partilha de objetos (copos, talheres, brinquedos, etc…) uma vez que a saliva é um dos principais meios de transmissão da doença.

Saber Mais

  1. S. Basetti, J. Hodgson, T. M. Rawson and A. Majeed. Scarlet fever: a guide for general practitioners. London Journal of Primary Care, 2017, vol. 9, nº 5, 77–79.
  2. Michael E Pichichero. Complications of streptococcal tonsillopharyngitis. Março 2019. Acedido a 31 de Maio de 2020. www.uptodate.com
  3. Ellen R Wald. Group A streptococcal tonsillopharyngitis in children and adolescents: Clinical features and diagnosis. Fevereiro 2020. Acedido a 31 de Maio de 2020. www.uptodate.com
  4. Michael E Pichichero. Treatment and prevention of streptococcal pharyngitis. Janeiro 2020. Acedido a 31 de Maio de 2020. www.uptodate.com.
  5. NOC DGS – 020/2012 - Diagnóstico e Tratamento da Amigdalite Aguda na Idade Pediátrica.

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