Bronquiolite obliterante
Introdução
Definição
A bronquiolite obliterante (BO) é uma forma rara de doença pulmonar obstrutiva crónica que ocorre após um insulto grave ao trato respiratório inferior, resultando em fibrose das pequenas vias aéreas. Do ponto de vista nosológico, é englobada nas doenças do interstício pulmonar.
Epidemiologia e etiologia
Em idade pediátrica a etiologia pós-infeciosa é a mais frequente, sendo a infeção por adenovírus a causa mais comum. Não há dados de incidência desta patologia, mas pensa-se que nos últimos anos tenha havido uma diminuição do número de casos, provavelmente pela diminuição dos surtos de infeção a adenovírus.
Tabela 1 – Causas de bronquiolite obliterante
Pós-Infeciosas |
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Não infeciosas |
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Fisiopatologia
Após um insulto inicial, há lesão celular com necrose que gera um infiltrado inflamatório nos bronquíolos terminais e nos alvéolos. Esta inflamação resulta em obstrução da via aérea, que pode ser completa ou parcial. Nos casos mais graves pode haver destruição do músculo e tecido elástico com fibrose da parede. Existem zonas de atelectasia e de air trapping. Histologicamente definem-se dois padrões de BO: proliferativo e constritivo. Este último é o mais frequente nas crianças com BO pós-infeciosa. Devido à obstrução a resistência da via aérea e o trabalho respiratório aumentam. A perfusão de áreas mal ventiladas gera hipoxemia e a diminuição da ventilação eficaz leva a hipercapnia. A fisiopatologia da síndrome de bronquiolite obliterante, que ocorre em doentes transplantados, é desconhecida.
História Clínica
Anamnese
Na fase aguda o quadro é habitualmente semelhante a uma infeção respiratória baixa com febre, tosse e dificuldade respiratória. A principal diferença é a evolução clínica atípica, com necessidade de oxigenoterapia mais prolongada, com recuperação mais lenta e por vezes incompleta. Após a fase aguda a taquipneia/dispneia, a tosse produtiva, o cansaço e a dificuldade alimentar (nos lactentes) persistem. Pode haver períodos de melhoria alternados com agudizações, mas raramente a criança fica completamente assintomática.
A anamnese cuidada pode sugerir diferentes etiologias:
- Febre ou dificuldade respiratória súbita – infeção
- Dificuldade alimentar - aspiração
- Exposição a produtos tóxicos ou animais – pneumonite de hipersensibilidade
- Antecedentes pessoais de doença autoimune, imunodeficiência, doenças do tecido conjuntivo (como causa secundária)
Exame objectivo
No exame objetivo pode haver sinais de dificuldade respiratória (taquipneia, utilização de músculos acessórios) com hipoxemia e na auscultação pulmonar prolongamento do tempo expiratório, fervores e sibilos. Na maioria dos casos, a criança tem sinais de doença moderada a grave.
Após a fase aguda a dispneia e as alterações auscultatórias persistem e habitualmente há má resposta à terapêutica broncodilatadora. Pode observar-se hipocratismo digital e alterações da conformação da parede torácica, com pectus escavatum.
Diagnóstico Diferencial
É importante excluir outras causas de doença pulmonar crónica nomeadamente: fibrose quística, défice de alfa-1-antitripsina, displasia broncopulmonar, imunodeficiências, tuberculose.
Exames Complementares
Atualmente com o avanço dos exames de imagem disponíveis, é possível chegar ao diagnóstico de BO pelo conjunto de dados clínicos e imagiológicos, sem necessidade do exame histopatológico. Contudo, a confirmação diagnóstica é apenas feita através de biópsia pulmonar. A avaliação imagiológica deve incluir:
- Radiografia de tórax – habitualmente mostra um padrão intersticial com hiperlucência unilateral ou bilateral e aumento do volume pulmonar. Pode haver áreas dispersas de atelectasia ou consolidação.
- Tomografia computorizada de alta resolução (TCAR) – é o exame mais sensível. Os sinais mais frequentemente encontrados são o padrão em mosaico, com áreas de hiperdensidade alternando com áreas de hipodensidade, fenómenos de air trapping, espessamento peribrônquico, bronquiectasias e atelectasias sub-pleurais.
- Cintilografia pulmonar de Ventilação/Perfusão – mostra áreas com alterações da ventilação/perfusão e é útil para avaliação da extensão, distribuição e gravidade do envolvimento pulmonar.
A realização de provas de função respiratória também é importante não só no diagnóstico como no follow-up. Habitualmente evidenciam um padrão obstrutivo irreversível.
Tratamento
O tratamento é essencialmente de suporte. A administração de oxigénio suplementar para manter uma adequada saturação de O2 previne o desenvolvimento de hipertensão pulmonar e insuficiência cardíaca. A fisioterapia respiratória pode ajudar na mobilização de secreções evitando infeções recorrentes. Na suspeita de aspiração por refluxo GE este deve ser tratado. Deve ainda ser assegurado um adequado suporte nutricional, pela maior perda calórica que estas crianças têm, como resultado de um aumento do esforço respiratório.
A utilização de corticoides inalados com o intuito de melhorar o componente inflamatório e corticoides orais ou pulsos de metilprednisolona nos períodos de agudização mostrou benefício em alguns estudos.
O papel dos broncodilatadores não é consensual pois os doentes com BO tem uma obstrução fixa. Contudo, podem ser utilizados quando se observa uma melhoria clínica na criança.
Os antibióticos são importantes para o tratamento de infeções secundárias e também têm sido utilizados como terapêutica profilática, como é o caso dos macrólidos. A azitromicina mostrou benefício nos doentes com BO pós-transplante, pela sua acção anti-inflamatória e imunomoduladora. Nos casos de BO pós-infeciosa, alguns estudos mostraram uma melhoria clínica e imagiológica em associação com um corticoide oral.
Contudo, pela raridade desta patologia, não há estudos randomizados e controlados em idade pediátrica pelo que a utilização destas terapêuticas é controversa.
Evolução
A maioria das crianças com sintomas ligeiros melhoram progressivamente até à adolescência. Algumas continuam a ter manifestações clínicas importantes.
A mortalidade é baixa, sendo maior nos casos de BO pós-transplante.
A morbilidade, principalmente nos primeiros anos de doença, pode ser elevada pelo número de internamentos em contexto de infeções secundárias e por episódios de agudização.
Recomendações
- Reforçar o cumprimento do Programa Nacional de Vacinação
- Realizar a vacina anual contra a gripe
- Considerar profilaxia com o anticorpo monoclonal para VSR (de acordo com as orientações da DGS);
- Evitar exposição ao fumo do tabaco
Bibliografia
- Fischer GB, Sarria E, Mattiello R, Mocelin H, Castro-Rodriguez JA. Post Infectious Bronchiolitis Obliterans in Children. Paediatric Respiratory Reviews 2010; 233–239.
- Li YN, Liu L, Qiao HM, Cheng H, Cheng HJ. Post-infectious bronchiolitis obliterans in children: a review of 42 cases. BMC Pediatrics 2014;14:238.
- Castro-Rodriguez JA et al. Postinfectious bronchiolitis obliterans in children: the South American contribution. Acta Paediatr 2014;103:913-21.
- Ferreira da Silva LVR, Pinto LA, Steinc R. Use of macrolides in lung diseases: recent literature controversies. J Pediatr 2015;91:S52-S60.
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