Tuberculose pulmonar
Introdução
A tuberculose é uma doença infeciosa, transmitida por via inalatória, que afeta maioritariamente os pulmões, designando-se tuberculose pulmonar (TP); pode também acometer outros órgãos. O agente etiológico é o bacilo de Koch (Mycobacterium tuberculosis).
Epidemiologia
A estimativa da incidência de TP em idade pediátrica configura um desafio devido a uma multiplicidade de fatores: dificuldade no diagnóstico, incidência de manifestações extra-pulmonares e sub-notificação dos casos.
Em Portugal, em 2020, foram notificados 25 novos casos em crianças ≤ 5 anos e 17 casos em crianças dos 6 aos 14 anos.
História Clínica
Anamnese
Deve suspeitar-se do diagnóstico de TP em crianças com manifestações clínicas significativas como tosse com duração superior a 2-3 semanas, febre prolongada, suores noturnos, astenia, anorexia, perda ponderal e atraso de crescimento e com contexto epidemiológico relevante (contacto próximo recente com um doente com tuberculose e/ou residência presente ou passada ou viagem com pelo menos 1 mês de duração para uma área onde a tuberculose é endémica). A tosse, um dos sintomas mais proeminentes, pode ser seca ou produtiva, sendo que a expetoração pode-se apresentar raiada de sangue.
Importa referir que as manifestações clínicas da doença diferem consoante o grupo etário da criança e consoante a forma da doença (se tuberculose pulmonar ou tuberculose extrapulmonar).
Exame objectivo
No exame objetivo deve ser avaliado o estado geral do doente, nomeadamente aspeto emagrecido, palidez cutânea, entre outros sinais.
Devem ser avaliados os sinais vitais: tensão arterial, frequência cardíaca, frequência respiratória, saturação periférica de oxigénio e dor.
Por forma a aferir eventual perda ponderal, deve ser avaliado o padrão de crescimento do doente (altura e peso) através das curvas de percentil.
A auscultação pulmonar poderá ser normal se doença ligeira a moderada. Quando alterada, poderá evidenciar crepitações inspiratórias ou após acessos de tosse. Outras alterações incluem macicez à percussão e diminuição do frémito vocal que poderão indicar derrame pleural.
O exame do abdómen é habitualmente normal nos casos de TP, podendo mostrar alterações como dor ou massas palpáveis no caso de tuberculose extra-pulmonar.
Diagnóstico Diferencial
A TP faz diagnóstico diferencial com uma panóplia de patologias, mais frequentemente com outras doenças infeciosas do trato respiratório (como por exemplo: infeção por Mycobacterium bovis, micobactérias não tuberculosas ou infeções fúngicas).
Devido à sua manifestação com sintomas constitucionais, faz ainda diagnóstico diferencial com doenças do foro oncológico como o linfoma.
Exames Complementares
O diagnóstico de TP é definitivamente estabelecido pela identificação do M. tuberculosis em exames culturais de uma secreções ou fluídos corporais.
O diagnóstico de TP em idade pediátrica poderá constituir um desafio devido às alterações inespecíficas na radiografia do tórax, natureza paucibacilar da doença e inexistência de um teste diagnóstico com boa acurácia. Assim, o diagnóstico é frequentemente realizado com base em critérios clínicos.
O IGRA (Interferon-gamma release assay) e a PCT (prova cutânea tuberculínica) avaliam a sensibilização imunológica aos antigénios proteicos da micobactéria. Acima dos 2 anos de idade dever-se-á utilizar o IGRA; abaixo dos 2 anos o indicado é a PCT.
IGRA e/ou PCT positivos são sugestivos de infeção pelo M. tuberculosis (ao contrário da PCT, o IGRA não é afetado pelo estado vacinal do indivíduo). Se IGRA e/ou PCT negativos não excluem o diagnóstico (falsos-negativos do IGRA: doença avançada; falsos-negativos da PCT: <6 meses, imunossupressão).
Tratamento
O tratamento empírico consiste na terapêutica padrão com quatro fármacos: isoniazida (10-15 mg/Kg/dia, máximo 300mg/dia), rifampicina (15-20 mg/Kg/dia, máximo 600mg/dia), pirazinamida (30-40 mg/Kg/dia, máximo 2g/dia) e etambutol (15-25 mg/Kg/dia, máximo 1g/dia). De referir que quando é conhecido o perfil de suscetibilidade do caso- índice pode ser considerada a utilização de três fármacos. A duração e o esquema terapêutico têm por base a idade da criança e critérios clínicos sendo que o período mínimo de tratamento são 4 meses.
Existem tratamentos alternativos, que incluem fármacos de segundo linha, reservados para situações em que há suspeita ou confirmação de resistência aos antituberculostáticos.
Os efeitos adversos da medicação são raros em idade pediátrica:
- Etambutol: neurite ótica (habitualmente reversível), diminuição da capacidade discriminatória das cores verde-vermelha;
- Isoniazida: elevação ligeira das enzimas hepáticas, neuropatia periférica (se administrada juntamente com piridoxina, menor risco de neuropatia);
- Rifampicina: coloração alaranjada da urina, trombocitopenia, hepatite;
- Pirazinamida: hepatotoxicidade, hiperuricémia e artralgia.
Evolução
A nível mundial, a tuberculose acarreta índices de morbilidade e mortalidade significativos. Assim, em 2020, estimou-se terem existido 1,3 milhões de mortes por TP, à escala mundial, sendo que não houve registos de mortalidade em Portugal.
Contudo, importa referir que o tratamento apresenta excelentes resultados com uma taxa de mortalidade inferior a 1%.
Recomendações
As crianças pequenas apresentam um risco elevado de evoluir para TP ativa após exposição, pelo que deverão ser precocemente identificadas.
Medidas de higiene respiratória, investigação dos doentes que apresentem sintomas de TP, isolamento dos casos suspeitos e comprovados, investigação epidemiológica do caso- índice, rastreio ativo de grupos de risco e tratamento precoce dos doentes são fundamentais.
É imperativo identificar adequadamente todas as crianças elegíveis para a vacina BCG.
Saber Mais
Glossário:
Bacilo de Koch; BCG; Micobacterium tuberculosis; Tuberculose; Tuberculose pulmonar.
Bibliografia
- Nolt D, Stark JR and Committee on Infectious Diseases. Tuberculosis Infection in Children and Adolescents: Testing and Treatment. 2021; 148(6): e2021054663. doi: 10.1542/peds.2021-054663
- Adams L, Starke JR. (2023) Tuberculosis disease in children: epidemiology, clinical manifestations and diagnosis. Disponível em https://www.uptodate.com/contents/tuberculosis-disease-in-children-epid…;
- Adams L, Starke JR. (2023) Tuberculosis disease in children: Treatment and prevention. Disponível em: https://www.uptodate.com/contents/tuberculosis-disease-in-children-treatment-and-prevention;
- Antunes A, Carvalho AC, Gonçalves AF, Ferreira B, Ribeiro C, Santos CL, et al (Programa Nacional para a Tuberculose). Manual de Tuberculose e Micobactérias não tuberculosas. Lisboa, 2020 (1ª edição);
- Thomas TA. Tuberculosis in Children. Pediatr Clin North Am. 2017; 64(4):893-909. doi: 10.1016/j.pcl.2017.03.010.
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