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Introdução

Definição

A pneumonia adquirida na comunidade em idade pediátrica tem habitualmente uma evolução favorável. Se isso não ocorrer, verificando-se uma forma de apresentação mais grave, evolução lenta ou arrastada, ou aparecimento de critérios de gravidade, com necessidade de cuidados diferenciados ou intensivos, deve suspeitar-se da presença de complicações.

Epidemiologia

Cerca de 10 a 40% dos doentes em idade pediátrica com o diagnóstico de pneumonia adquirida na comunidade necessitam de internamento hospitalar e, destes, 7% apresentam complicações sistémicas ou pulmonares.

Neste capítulo são apresentadas as seguintes complicações:

  • Sistémicas (sépsis, síndroma de dificuldade respiratória aguda, coagulação intravascular disseminada, síndroma de secreção inapropriada de hormona antidiurética, trombocitose)
  • Pulmonares (pneumonia persistente, derrame pleural parapneumónico, empiema, abcesso pulmonar, pneumonia necrotizante).

História Clínica

COMPLICAÇÕES

Na maioria dos doentes pediátricos com pneumonia é expectável que ocorra melhoria clínica franca ao fim de 48 a 72 h de tratamento, com apirexia, normalização do estado geral, do apetite e da dificuldade respiratória. Se tal não ocorrer, ou se a manifestação inicial for muito grave, com insuficiência respiratória, instabilidade hemodinâmica ou alteração do estado de consciência, deve-se suspeitar da presença de complicações.

COMPLICAÇÕES SISTÉMICAS

Sépsis

A generalização da infecção é menos frequente na população pediátrica que na adulta. Ocorre por resposta inflamatória sistémica à infecção, acompanhada de disfunção de órgãos alvo. O choque séptico surge quando há disfunção cardiovascular com necessidade de correcção de volume e suporte inotrópico. A abordagem sistematizada destes doentes críticos deve incluir internamento em Unidade de Cuidados Intensivos.

Síndroma de dificuldade respiratória aguda (SDRA)

Define-se pela existência de hipoxemia refractária à terapêutica com oxigénio suplementar, e ocorre após lesão pulmonar em que haja aumento da permeabilidade vascular e diminuição da complacência pulmonar. É o caso da pneumonia com sépsis, traumatismo torácico ou queimadura. A radiografia do tórax revela habitualmente opacidades bilaterais. Necessita habitualmente de ventilação mecânica. A mortalidade de SDRA que ocorre como complicação de pneumonia é de 5 a 10%, mais baixa que noutras situações.

Síndroma de secreção inapropriada de hormona anti-diurética (SIADH)

Caracteriza-se pela libertação excessiva de hormona antidiurética pela hipófise posterior, levando a hiponatrémia de diluição. A etiologia é desconhecida e estima-se que ocorra em 30% das crianças internadas por pneumonia. Em casos de hiponatrémia grave, podem ocorrer alterações do estado de consciência e convulsões. É assim, recomendado que, em crianças com pneumonia da comunidade e hiponatremia, seja feita uma restrição hídrica (50 a 66% das necessidades diárias), desde que não haja desidratação ou sinais de choque.

Coagulação intra-vascular disseminada

Esta coagulopatia de consumo pode complicar a pneumonia por S pneumoniae ou Mycoplasma pneumoniae. Caracteriza-se laboratorialmente por aumento de tempo de protrombina e do tempo de tromboplastina parcial, com diminuição de fibrinogénio e das plaquetas. Pode necessitar de terapêutica agressiva com plasma fresco congelado e plaquetas, em Unidade de Cuidados Intensivos.

Trombocitose

O aumento das plaquetas é muito frequente nas infecções pediátricas. Parece haver associação entre trombocitose extrema e maior incidência de complicações pleuropulmonares (empiema ou derrame pleural), podendo ser considerada um indicador prognóstico. Não há, habitualmente, indicação para terapêutica antiagregante.

COMPLICAÇÕES PULMONARES

Pneumonia persistente

A pneumonia persistente ocorre na ausência de melhoria ao fim de 48 a 72 horas de antibioticoterapia empírica com beta-lactâmico, nomeadamente no que diz respeito à febre e sinais de dificuldade respiratória. Pode indiciar falência / má resposta à terapêutica inicial (S pneumoniae resistente à penicilina, M pneumoniae, Streptococcus pyogenes, S áureos, Mycobacterium tuberculosis) ou etiologia viral (Vírus Influenza ou Adenovírus). Justifica-se dessa forma, consoante os casos, alargar a avaliação etiológica e ponderar a alteração do antibiótico para ceftriaxone ou vancomicina ou a associação de macrólido, tuberculostáticos ou oseltamivir. É também necessário ponderar que a pneumonia possa ocorrer num contexto de doença pulmonar subjacente como fibrose quística, imunodeficiência, malformação pulmonar, obstrução brônquica.

Derrame pleural parapneumónico / Empiema

A lesão parenquimatosa provocada pela infecção pode aumentar a permeabilidade capilar e levar à acumulação de líquido no espaço pleural, que ocorre em três fases distintas. Na fase inicial da infecção, o líquido é seroso e estéril (fase exsudativa – derrame pleural parapneumónico) mas, posteriormente, ocorre influxo de polimorfonucleares e bactérias e formação de pús (fase fibropurulenta - empiema). De seguida, pode ocorrer acumulação de fibrina no espaço pleural, com loculação e septação (fase de organização - paquipleurite). A causa mais frequente é S pneumoniae (serotipo 1 e 3). O aumento de serótipos abrangidos pela vacina antipneumocócica 13-valente, que inclui estes, tem vindo a modificar, seguramente, esta epidemiologia. Clinicamente, o derrame / empiema deve ser suspeitado em doentes que mantenham febre ou dificuldade respiratória após 48 a 72 horas de antibioticoterapia endovenosa. Sinais clínicos como diminuição do murmúrio vesicular, macicez à percussão ou abolição das vibrações vocais devem ser confirmados por radiografia do tórax. A ecografia torácica pode ajudar a caracterizar o tipo de líquido ou a existência de septos de fibrina, e auxiliar na punção diagnóstica ou colocação de dreno torácico. A tomografia computorizada do tórax pode igualmente caracterizar melhor a situação, e contribuir para o diagnóstico diferencial de derrame pleural (neoplasia, tuberculose, etc.). A toracocentese pode permitir a identificação do agente etiológico por técnicas de microbiologia clássica ou polymerase chain reaction. O exame citoquímico do líquido pleural permite distinguir transudado, de exsudado e identificar empiema (pH

Abcesso pulmonar

O abcesso pulmonar apresenta-se como uma cavidade com mais de 2 cm, de paredes espessas, contendo material purulento proveniente da destruição aguda do parênquima pulmonar, por inflamação, necrose e cavitação. É raro e surge em doentes com comorbilidades respiratórias, situações de refluxo ou aspiração. O agente pode ser identificado por punção pulmonar, predominando S pneumoniae, S áureos, S pyogenes, ou, em casos de doença pulmonar crónica ou aspiração, bactérias anaeróbicas ou Gram negativas. Clinicamente, o abcesso cursa com febre, tosse, dispneia, dor torácica, sendo encontradas diminuição de entrada de ar, fervores, macicez à percussão. A evolução é insidiosa. A radiografia de tórax pode identificar uma cavidade de paredes espessas, por vezes preenchida por líquido, com nível hidroaéreo. A TC é o exame mais informativo, por caracterizar com pormenor a lesão e guiar eventual punção transtorácica. A antibioticoterapia é a mesma das complicações da pneumonia, de preferência dirigida ao agente identificado, e deve ser prolongada até às oito semanas. Pode justificar-se a associação de agentes com acção contra agentes anaeróbicos, como clindamicina ou metronidazol. Nas crianças não há, em geral, não há, necessidade de drenagem cirúrgica. O prognóstico é habitualmente favorável, podendo ocorrer empiema, fístula bronco-pleural, pneumotórax ou colonização fúngica.

Pneumonia necrotizante    

Em cerca de 20% das crianças com empiema, há, concomitantemente, necrose e liquefacção do parênquima pulmonar secundária a isquémia e microtrombose dos vasos pulmonares. Etiologicamente, esta situação associa-se a S áureos ou S pneumoniae (serotipos 1, 3, 9V e 14). O diagnóstico é feito por TC, que pode identificar áreas de necrose e cavidades arejadas de paredes finas (pneumatocelos). Se estas áreas são localizadas em zonas superficiais, pode ocorrer fístula broncopleural e pneumotórax. A pneumonia necrotizante necessita de períodos prolongados de antibioticoterapia endovenosa. Pode haver necessidade de procedimentos cirúrgicos como lobectomia ou pleurodese.    

Atelectasia

Atelectasia corresponde ao colapso de uma parte ou de todo um pulmão. Pode ocorrer após uma pneumonia na sequência de impactação por rolhão secreções. A cinesiterapia poderá ser útil. A broncofibroscopia pode ter interesse na terapêutica ou diagnóstico de atelectasias como complicação da pneumonia em pediatria.

Evolução

Após uma pneumonia complicada é habitualmente recomendado o seguimento clínico, com reavaliação em consulta após o internamento, bem como a realização de radiografia do tórax cerca de 4 a 6 semanas depois, altura em que é esperada completa resolução do quadro. No caso de se manter uma atelectasia residual pode-se suspeitar de lesão obstrutiva, como corpo estranho, compressão extrínseca ou outra alteração, sendo frequentemente recomendada a realização de broncofibroscopia.

Recomendações

A prevenção das complicações da pneumonia inclui o diagnóstico precoce e terapêutica atempada e dirigida. Deve ser evitado o contacto com fumo de tabaco. O cumprimento da vacinação anti-sarampo, anti-H. influenzae, anti-pneumocócica 13-valente e, quando indicado, anti-gripe e anti-varicela, pode contribuir para um menor risco de pneumonia complicada.

Bibliografia

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