Menu

Introdução

Definição

Bronquiectasias são anomalias estruturais da árvore brônquica que se acompanham de dilatação e distorção. Por diferentes processos fisiopatológicos as paredes brônquicas tornam-se menos resistentes, cronicamente inflamadas e colapsáveis. Ocorrem em patologias congénitas ou adquiridas, que favorecem estreitamento ou obstrução brônquica, drenagem anómala de secreções ou infecções.

Epidemiologia

A incidência tem relação com as condições sanitárias das populações e depende do método de diagnóstico usado, variando entre 0,5 (Finlândia) e 1500 / 100.000 crianças (Oceânia).

História Clínica

Anamnese

O sintoma mais comum da criança com bronquiectasias é a tosse em 80 a 90% dos casos, que é persistente e se acompanha de expectoração purulenta em 50 a 75% dos casos. Contudo, as crianças mais jovens podem não ter capacidade de expelir as secreções. Nas exacerbações, pode ocorrer aumento da tosse e expectoração, febre, dispneia e dor pleurítica. As hemoptises são raras na criança. Com a evolução da situação para doença pulmonar crónica obstrutiva, surgem progressivamente intolerância ao esforço, cianose, hipertensão pulmonar e core pulmonale.   Perante a suspeita clínica de bronquiectasias, é necessário identificar a sua etiologia, bem como avaliar a gravidade da doença pulmonar crónica.

A anamnese pode orientar para uma etiologia. Assim, pensamos em doenças gerais como a fibrose quística e imunudeficiências, se há má progressão ponderal e diarreia ou esteatorreia; em discinésia ciliar primária, se há doença sinusal associada; em aspiração de corpo estranho ou alteração da deglutição, se há fenómenos de engasgamento; em doença neurológica se há compromisso de deglutição e episódios de refluxo gastroesofágico; em malformações congénitas das vias aéreas ou compressão por estruturas cardiovasculares se há outras anomalias congénitas ou se as manifestações se iniciam precocemente na vida. O diagnóstico prévio de infecção pulmonar grave (sarampo, tosse convulsa, tuberculose) sugere bronquiectasia de causa sequelar.

Exame objectivo

No exame objectivo podem auscultar-se fervores sub-crepitantes, roncos e sibilos nas áreas pulmonares envolvidas bem como aspectos sugestivos da patologia subjacente. Devem ser também pesquisados sinais de doença pulmonar crónica grave (hipocratismo digital, cianose, deformação torácica, entre outras).

Diagnóstico Diferencial

Perante o diagnóstico de bronquiectasias, é mandatório esclarecer a sua etiologia, apesar de em 40% dos casos não se encontrar uma causa e poderem ser consideradas idiopáticas.

As bronquiectasias podem ser localizadas ou generalizadas. As primeiras pressupõem causa local como corpo estranho retido, obstrução intraluminal (granuloma, tumor), anomalia congénita (sequestro broncopulmonar, estenose brônquica, broncomalácia, brônquio traqueal), compressão extrínseca (adenopatia, compressão vascular), síndroma do lobo médio, sequela de infecção localizada (pneumonia bacteriana, bronquite bacteriana crónica). As bronquiectasias generalizadas ocorrem em situações de doença generalizada como fibrose quística, imunodeficiência, discinesia pulmonar primária, síndroma aspirativo crónico, sarcoidose, sequela de infecção pulmonar grave, e aspergilose broncopulmonar alérgica.

A investigação diagnóstica pode ser orientada pelo ponto de vista fisiopatológico, e assim a etiologia das bronquiectasias pode ser categorizada em:

Estenose ou obstrução brônquica congénita: malácia localizada ou disseminada, estenose, brônquio traqueal, sequestro, quisto broncogénico, malformação pulmonar congénita

Estenose ou obstrução brônquica adquirida: corpo estranho retido (habitualmente orgânico); impactação de muco (atelectasia persistente, como síndroma de lobo médio); doenças granulomatosas das vias aéreas (tuberculose), adenopatias compressivas (linfomas, tuberculose) ou tumores endobrônquicos

Imunodeficiências: agamaglobulinemia, défices de subclasses de IgG, imunodeficiência comum variável, síndroma de DiGeorge, défices de complemento, doença granulomatosa crónica, outras imunodeficiências congénitas, infecção VIH

Drenagem anormal de secreções: fibrose quística, discinesia ciliar primária, doenças neuromusculares

Infecção: bronquite bacteriana persistente, pneumonia (bacteriana, adenovírus micoplasma, sarampo), tosse convulsa, síndromas aspirativos recorrentes (doenças neurológicas, refluxo gastroesofágico, fístula traqueoesofágica)

Doenças auto-imunes multissistémicas: lupus eritematoso sistémico, sarcoidose, doença inflamatória intestinal.

Exames Complementares

Patologia Clínica

Estudos laboratoriais: de acordo com a suspeita clínica, podem ser solicitados prova de suor, estudos genéticos, de imunidade e da função ciliar, prova tuberculínica, broncofibroscopia, phmetria e estudos de deglutição. O estudo da função respiratória avalia a gravidade da doença pulmonar crónica e a sua progressão ao longo do tempo.

Imagiologia

Radiografia do tórax: atelectasias lineares, espessamento da parede das vias aéreas ou opacidades irregulares.

Tomografia computorizada de alta resolução (TC): o método de imagem mais sensível no diagnóstico de bronquiectasias. É critério diagnóstico um diâmetro interno das vias aéreas superior ao das artérias ou brônquios normais visualizados na proximidade. Podem associar-se níveis líquidos, rolhões de secreções e air trapping. A distribuição e localização das bronquiectasias varia com a patologia subjacente. A TC pode diagnosticar causas subjacentes: malformações das vias aéreas, compressões vasculares ou adenopatias.

Tratamento

Médico

Os objectivos são: aliviar os sintomas, melhorando a drenagem de secreções, tratando as infecções e controlando o processo inflamatório, evitar a progressão da doença e, se possível, resolução da causa subjacente,.

A atitude deve ser individualizada, de acordo com as características do doente e dos agentes patogénicos isolados.

O tratamento inclui antibióticos, drenagem das vias aéreas, mucolíticos, broncodilatadores e fármacos anti-inflamatórios.

Os antibióticos são usados no tratamento de exacerbações e, por vezes, em esquemas prolongados, se houver exacerbações frequentes ou degradação progressiva da função pulmonar.

A escolha de antibióticos é habitualmente feita de acordo com os agentes isolados em culturas de expectoração, mais difíceis de obter em crianças de menor idade. Na ausência de agente isolado, pode ser indicada terapêutica empírica dirigida a Streptococcus pneumoniae, Haemophilus influenzae, Moraxella catarrhalis (amoxicilina + ácido clavulânico, ou cefalosporina de segunda ou terceira geração). A duração do tratamento recomendado é de 10 a 14 dias, por via oral ou endovenosa. Por vezes, as exacerbações têm causa exclusivamente viral, (rinovirus, parainfluenza ou influenza), ou mista.

O tratamento antibiótico prolongado, sistémico ou inalado, é comum nos doentes com fibrose quística, sendo necessário comparar os potenciais benefícios com o risco de desenvolvimento de resistências bacterianas. Nas crianças com colonização persistente ou exacerbações muito frequentes, podem ser ponderados cursos quinzenais de antibioticoterapia sistémica. A escolha do fármaco deve ser feita de acordo com os agentes isolados e a resposta clínica do doente. Em situações de isolamento de Pseudomonas aeruginosa está recomendada a utilização de aminoglicosidos inalados, em esquema contínuo.

A eliminação de secreções é feita através da optimização da função mucociliar. Diversas técnicas são usadas: drenagem postural, percussão, técnicas de tosse assistida. O preço, a conveniência para as famílias, e a aderência e tolerância dos doentes são aspectos a ter em conta.

A hidratação das vias aéreas e das secreções deve ser também ponderada. Na fibrose quística está recomendado o uso de alfa dornase, aerossóis de cloreto de sódio hipertónico ou manitol mas estas medidas parecem não ter benefício em bronquiectasias de outras etiologias.

A utilização de broncodilatadores inalados, que podem diminuir a obstrução e facilitar a eliminação de muco, pode ser útil, havendo necessidade de efectuar mais estudos.

Em relação aos anti-inflamatórios, alguns doentes parecem beneficiar de terapêutica crónica com azitromicina oral em dias alternados. Apenas os doentes com fibrose quística beneficiam com esquema crónico de ibuprofeno oral. Os corticosteróides inalados não têm papel na terapêutica das bronquiectasias em pediatria, à excepção das crianças com asma ou aspergilose broncopulmonar alérgica.

Deve ser dada especial atenção ao estado nutricional e de hidratação destes doentes, bem como à necessidade de oxigénio suplementar, nomeadamente durante o sono. As complicações cardíacas devem ser monitorizadas. Deve ser assegurada a evicção tabágica.

Cirurgia

A cirurgia pode ter um papel na ressecção de bronquiectasias localizadas com complicações importantes, ou na resolução de situações de hemoptise, empiema ou pneumotórax. Em casos de insuficiência respiratória terminal, pode ser necessária a transplantação pulmonar.

Evolução

O prognóstico das bronquiectasias depende da patologia de base. A classificação clássica de Reid, que divide as bronquiectasias em cilíndricas, varicosas e saculares, correlaciona-se mal com a evolução clínica, etiologia e fisiopatologia. Estudos recentes mostraram que as bronquiectasias cilíndricas podem ser reversíveis se o processo subjacente puder ser tratado. Os outros dois tipos correspondem a alterações histopatológicas irreversíveis.

Recomendações

As crianças com bronquiectasias devem actualizar e manter rigorosamente os esquemas de vacinação recomendados. Deve ser feita vacinação antipneumocócica conjugada 13-valente e a polissacárida 23-valente, bem como a vacina da gripe anualmente e anti-sarampo. Nalguns casos de imunodeficiência podem estar contra-indicadas vacinas vivas.

Bibliografia

  1. Brower KS, Del Vecchio MT, Aronoff SC, et al. The etiologies of non-CF bronchiectasis in childhood: a systematic review of 989 subjects. BMC Pediatr 2014; 14:4.
  2. Goyal V, Grimwood K, Marchant J, et al. Pediatric bronchiectasis: No longer an orphan disease. Pediatr Pulmonol 2016; 51:450.
  3. Kapur N, Masters IB, Morris PS, et al. Defining pulmonary exarcebation in children with non-cystic fibrosis bronchiectasis. Pediatr Pulmonol 2012; 47:68.
  4. Brodt AM, Stovold E, Zhang L. Inhaled antibiotics for stable non-cystic fibrosis bronchiectasis: a systematic review. Eur Respir J 2014; 44:382.
  5. Fakhoury K. Management of bronchiectasis in children without cystic fibrosis. Mallory GB TW, ed. UpToDate. Waltham, MA: UpToDate Inc. http://www.uptodate.com (Accessed on December 10, 2017.)

Deseja sugerir alguma alteração para este tema?
Existe algum tema que queira ver na Pedipedia - Enciclopédia Online?

Envie as suas sugestões

Newsletter

Receba notícias da Pedipedia - Enciclopédia Online no seu e-mail