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Introdução

Definição

Diferença de tamanho ou diâmetro entre a pupila dos dois olhos (figura 1).

Figura 1. Anisocória, com pupila do olho esquerdo maior do que do olho direito

A regulação do tamanho da pupila faz-se através do tónus enervacional dos Sistemas Simpático e Parassimpático, integrantes do Sistema Nervoso Autónomo, sobre os músculos da íris. Quando estamos em situação de luz, predomina a acção do Sistema Parassimpático sobre o músculo esfíncter da íris, levando a constrição pupilar ou miose; o inverso acontece em condições de pouca luz ou escuridão, com acção do Sistema Simpático sobre o dilatador da íris, induzindo dilatação pupilar ou midríase.

A estimulação simpática da íris depende de 3 neurónios sequenciais (figura 2), os quais atravessam ou estão em relação próxima com diversas estruturas anatómicas; a sua lesão a diferentes níveis leva à miose ou constrição pupilar, dado haver menos estímulo para a dilatação da pupila.

Figura 2. Via simpática ocular, formada por 3 neurónios. 1º neurónio (círculo verde) com origem no hipotálamo; 2º neurónio (círculo vermelho) com origem em centro cílio-espinhal localizado na medula espinhal, entre C8 e T1; 3º neurónio (círculo azul), com origem no gânglio cervical superior, próximo da carótida interna, de onde partem axónios para o esfíncter da íris

Quanto à enervação parassimpática (figura 3) sobre o esfíncter da íris, tem origem em dois núcleos do III par craniano (ou nervo oculomotor), os núcleos de Edinger-Westphal, situados no mesencéfalo, um de cada lado. Estas estruturas recebem informação relativa a um estímulo luminoso de ambos os olhos de forma independente, ou seja, a estimulação luminosa do olho direito vai levar à activação dos dois núcleos (direito e esquerdo), o mesmo acontecendo com o olho esquerdo; de cada um dos núcleos vai depois partir um estímulo que leva à constrição pupilar ipsilateral, através de fibras do III par craniano. Em termos práticos, a estimulação luminosa de um dos olhos leva à constrição pupilar bilateral, o chamado reflexo luminoso consensual. Quando há lesão das fibras parassimpáticas de um dos lados, a pupila tende a ficar maior, dado haver menos estímulo para a constrição pupilar.

Figura 3. Via parassimpática ocular. O estímulo luminoso, proveniente da retina e do nervo óptico, vai levar à activação dos núcleos de Edinger-Westphal (1), bilateralmente. Destes núcleos partem axónios que se dirigem, através do III par craniano, até ao gânglio ciliar (2), que por sua vez emite fibras que se dirigem para o esfíncter da íris

Epidemiologia

Cerca de 20% da população saudável apresenta anisocória fisiológica, benigna, sendo esta a causa mais comum na idade pediátrica.

História Clínica

Anamnese

Como referido, a principal forma de anisocória é fisiológica mas diversas causas poderão estar implicadas.

A anamnese é importante, dando-nos pistas em relação aos vários quadros clínicos, descritos mais à frente na secção Diagnóstico Diferencial.

Em relação à história clínica, devemos pesquisar:

  • história de parto traumático, nomeadamente necessidade de fórceps, que poderá explicar lesão do plexo braquial, com compromisso simultâneo da enervação simpática do olho (síndrome de Horner);
  • história de cirurgia ou patologia cervical (síndrome de Horner);
  • utilização recente de colírios, que possam induzir alteração do tamanho da pupila;
  • história recente de infecção ou imunização (pupila de Adie);
  • diplopia (III par craniano), por compromisso da normal motilidade ocular
  • dificuldade na leitura, por compromisso da acomodação; esta acção é da responsabilidade do músculo ciliar, cuja contracção também depende do sistema parassimpático e origina alteração da curvatura do cristalino, permitindo-nos ver ao perto;
  • dor cervical (síndrome de Horner), periocular (síndrome de Horner ou III par craniano) ou cefaleia (enxaqueca ou cefaleia tipo cluster)
  • outros sintomas neurológicos.

Exame objectivo

Perante um quadro de anisocória, o primeiro passo é perceber se a anisocória é mais evidente com luz ou com escuridão (figura 4):

Figura 4. Lado esquerdo: a anisocória é mais evidente em condições de luz, pelo que a lesão está do lado esquerdo (a pupila deveria ser mais pequena); lado direito: anisocória mais evidente na escuridão, pelo que a lesão está do lado direito (a pupila deveria ser maior)
  • se é mais evidente em condições de luz, o problema está do lado da pupila maior, que não contrai normalmente, fazendo pensar em defeito parassimpático;
  • se o defeito é mais evidente em condições de pouca luz / escuridão, o defeito está do lado da pupila mais pequena, que não dilata normalmente, fazendo pensar em defeito simpático.

Devemos também avaliar:

  • a “intensidade” com que cada pupila contrai com estímulo luminoso;
  • se existe ptose palpebral do lado afectado (parcial ou completa, sendo por vezes muito discreta);
  • avaliar os movimentos oculares, tentando perceber se existe alguma limitação, nomeadamente em parésias do III par craniano;
  • exame neurológico sumário;
  • palpação do pescoço, axila e abdómen, pela possibilidade de patologia tumoral em caso de suspeita de Síndrome de Horner na criança.

Depois de avaliados os parâmetros precedentes, podemos fazer testes farmacológicos para confirmar a nossa suspeita clínica, através da instilação de determinados colírios.

Diagnóstico Diferencial

Como referido, o primeiro passo é avaliar em que condição a anisocória é mais evidente, sendo o ponto de partida para um algoritmo diagnóstico:

  • anisocória mais evidente em condições de luz: disfunção parassimpática; pensar em pupila tónica de Adie e III par craniano;
  • anisocória mais evidente na escuridão: pensar em síndrome de Horner.

Existem outras situações passíveis de causar anisocória, que serão apenas referidas:

  • instilação acidental de colírio com acção midriática ou miótica;
  • uveíte crónica, condicionando aderências entre a íris e o cristalino, podendo levar a deformação ou rigidez da íris e, consequentemente, da pupila (figura 5);
  • traumatismo ocular, que poderá levar a disfunção do músculo esfíncter da íris, causando dilatação permanente da pupila;
  • situações malformativas da íris, como coloboma da íris (figura 6).
Figura 5. Sinéquias posteriores
Figura 6. Coloboma da íris
Pupila tónica de Adie

Situação benigna, uni ou bilateral (sendo que nesta última não ocorrerá anisocória, dado que as pupilas apresentam características semelhantes), que pode estar associada a infecção ou imunização nas semanas precedentes; pensa-se que poderá haver uma reacção auto-imune dirigida contra o 3º neurónio da via parassimpática oculomotora. É mais frequente em mulheres jovens, podendo raramente ocorrer em crianças.

Caracteriza-se na fase aguda por midríase do lado afectado, com fraca resposta à luz mas também com dilatação mais lenta (como se a pupila estivesse “rígida”), associada a dificuldade na visão de perto e fotofobia (figura 7). À observação oftalmológica, é característica uma contracção irregular da íris, mais facilmente identificada ao biomicroscópio. Numa fase posterior ou crónica, a pupila poder-se-á apresentar miótica.

Figura 7. A pupila do olho esquerdo está mais dilatada, contraindo menos com a luz e dilatando também menos na escuridão; há irregularidade na porção superior da pupila, que não é tão redonda com habitualmente, o que é altamente sugestivo de pupila tónica de Adie
Síndrome de Horner

Resulta da disfunção do Sistema Simpático.

Esta síndrome caracteriza-se por miose do lado afectado (figura 8), associada a ptose ipsilateral discreta (por compromisso da enervação de um músculo elevador da pálpebra, o músculo de Muller, dependente da estimulação simpática) e anidrose, que pode atingir toda a metade do corpo ipsilateral ou apenas a região frontal ipsilateral, dependendo do nível da lesão. Pode também ocorrer heterocromia da íris (íris do lado afectado de coloração mais clara) quando a síndrome ocorre em idade jovem.

Figura 8. Síndrome de Horner esquerdo, com pupila miótica (não dilata como habitualmente) e ptose palpebral

Pode ser de 2 tipos:

  • congénito: anisocória presente ao nascimento ou durante as primeiras 4 semanas de vida; geralmente associado a parto traumático, raramente causado por neuroblastoma
  • adquirido: idades mais tardias; é mandatório excluir neuroblastoma, que geralmente se manifesta até aos 5 anos de idade.

Ao contrário das crianças, as causas mais frequentes de síndrome de Horner do adulto são a dissecção da carótida, lesões para-selares (nomeadamente do seio cavernoso) e cefaleia em cluster.

Parésia do III par craniano

Este quadro caracteriza-se por midríase do lado afectado por disfunção parassimpática, associada a grau variável de ptose palpebral e oftalmoplegia (figura 9), por compromisso do músculo Levantador da Pálpebra Superior (não confundir com Músculo de Muller, também responsável por elevação da pálpebra superior mas com controlo simpático) e de vários músculos extra-oculares.

Na idade pediátrica, a situação mais comum é congénita (20-40% dos casos), seguida da etiologia traumática e tumoral, nomeadamente glioma do tronco cerebral.

Figura 9. Parésia do III par esquerdo, com midríase, ptose ligeira e olho desviado para fora e ligeiramente para baixo por compromisso oculo-motor

Exames Complementares

Os exames complementares de diagnóstico poderão passar por tomografia computorizada ou ressonância magnética da cabeça, pescoço e / ou tórax; análises ao sangue ácido e / ou urina ou até punção lombar.

Tratamento

Não existe tratamento para a anisocória mas sim para a causa, podendo passar por tratamento médico ou cirúrgico.

Na situação de pupila tónica de Addie, poderão ser prescritos óculos de leitura ou, em alternativa, um colírio que permita melhorar a visão de perto, pelo menos durante a fase aguda.

Evolução

O prognóstico da anisocória é variável, dependendo da causa.

Recomendações

Sempre que se detecta uma diferença no tamanho da pupila, deverá ser consultado um oftalmologista o mais rapidamente possível, dada a possibilidade de se tratar de uma condição que possa colocar em risco a vida da criança.

Bibliografia

  1. Patel R, Davis C, Sivaswamy L. Anisocoria-not always cause for alarm. J Pediatr. 2014 Jun;164(6):1497.
  2. Kaeser PF, Kawasaki A. Disorders of pupillary structure and function. Neurol Clin. 2010 Aug;28(3):657-77

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