Menu

Introdução

A paralisia cerebral (PC) é um termo genérico que engloba um conjunto heterogéneo de condições que têm em comum 4 princípios: ser permanente; ter etiologia não progressiva; ser um transtorno do movimento ou da postura e função motora; a lesão ocorrer num cérebro em desenvolvimento ou imaturo.

A definição prende-se com critérios clínicos e não etiológicos. Embora a condição em si não seja progressiva, as manifestações clínicas podem modificar-se à medida que ocorre a maturação do sistema nervoso central.

Etiologia

A etiologia é multifatorial, sendo que a anomalia pode ocorrer in útero, no período perinatal ou pós-natal. Os fatores ambientais mais comummente conhecidos associados à PC são a prematuridade e o baixo peso ao nascimento, enquanto que as que as causas genéticas podem estar envolvidas em 10 a 20% dos casos.

Outras fatores associados são as anomalias e infeções congénitas, a encefalopatia hipóxico-isquémica, o acidente vascular cerebral, a gestação múltipla, a patologia uterina materna, entre outros.

Embora, em muitos casos a etiologia permaneça desconhecida, é muito provável que a associação entre fatores genéticos e ambientais contribua frequentemente para o desenvolvimento da doença.

Epidemiologia

A prevalência estimada é de 2 casos por cada 1000 nascimentos. É maior em prematuros e aumenta à medida que diminuiu a idade gestacional e o peso ao nascimento.

História Clínica

Para o diagnóstico correcto e atempado da PC, é necessário realizar uma história clínica detalhada e um exame objetivo completo, que incluam um exame neurológico minucioso e uma correta averiguação das etapas do desenvolvimento.

Embora a idade média de diagnóstico seja por volta dos 18 a 24 meses, as alterações motoras podem evidenciar-se precocemente, sendo possível um diagnóstico de PC por volta dos 5 meses de idade corrigida.

Na histórica clínica, é necessário dar particular atenção aos seguintes pontos:

  • Revisão dos antecedentes pré e perinatais, de forma a identificar possíveis fatores de risco
  • Confirmar a realização e averiguar o resultado do rastreio endócrino-metabólico e rastreio auditivo
  • Averiguar antecedentes familiares, nomeadamente, história de perturbações de desenvolvimento intelectual, convulsões, doenças neurológicas ou neurodegenerativas, anomalias congénitas, tromboses ou acidentes vasculares
  • Avaliação do desenvolvimento estaturo-ponderal
  • Realização de exame neurológico, incluindo a avaliação do tónus, postura e coordenação
  • Avaliação detalhada do neurodesenvolvimento

Os primeiros sinais de alerta são habitualmente o comportamento atípico (excessiva irritabilidade ou tranquilidade), assimetria ou escassez de movimentos, anomalias do tónus (hipotonia, espasticidade ou distonia) e dificuldades na deglutição.

O atraso na aquisição das etapas do desenvolvimento é característico (por exemplo, não sentar aos 8 meses e ou a ausência de marcha autónoma aos 18 meses).

Outros sinais de alerta a considerar: preferência manual antes dos 12 meses e persistência da marcha em pontas.

Consoante o tipo e distribuição das anormalidades motoras, a PC pode ser dividida em diferentes subtipos: espástica, discinética e atáxica. Contudo as características podem sobrepor-se e ocorrerem subtipos mistos com frequência.

Além de tudo isto, é ainda importante pesquisar comorbilidades associadas, relacionadas com a disfunção cerebral:

  • Perturbação de desenvolvimento intelectual
  • Perturbação da linguagem
  • Epilepsia
  • Problemas de visão e/ou audição
  • Dificuldades alimentares e atraso de crescimento
  • Obstipação
  • Refluxo gastro-esofágico
  • Sialorreia
  • Escoliose
  • Problemas respiratórios e risco de aspiração
  • Disfunção urinária
  • Dor crónica

De uma forma geral, as crianças com atingimento motor mais severo, têm maior predisposição para o desenvolvimento de comorbilidades associadas.

Diagnóstico Diferencial

Dado apresentar sinais e sintomas típicos de muitas outras patologias, a PC é essencialmente um diagnóstico de exclusão. A distinção faz-se não só através dos vários exames complementares de diagnóstico (neuroimagem, estudos genéticos e metabólicos), mas também através da monitorização da evolução clínica da doença.

Existem algumas características que nos alertam para a possibilidade de outro diagnóstico que não a PC:

Dado apresentar sinais e sintomas típicos de muitas outras patologias, a PC é essencialmente um diagnóstico de exclusão. A distinção faz-se não só através dos vários exames complementares de diagnóstico (neuroimagem, estudos genéticos e metabólicos), mas também através da monitorização da evolução clínica da doença.

Existem algumas características que nos alertam para a possibilidade de outro diagnóstico que não a PC:

  • História familiar de doença neurológica
  • Ausência de fator de risco conhecido para PC
  • Regressão no desenvolvimento
  • Rápida deterioração neurológica
  • Marcado agravamento em períodos de maior catabolismo (ex: doenças do metabolismo)
  • Fraqueza muscular desproporcional ao grau de hipotonia (ex: miopatias, onde a fraqueza muscular é mais evidente que o grau de hipotonia, ao contrário da PC)
  • Atrofia muscular ou perda sensorial

Exames Complementares

O diagnóstico de PC é clínico. No entanto, deveremos recorrer a alguns exames complementares de diagnóstico, não só para excluir outros diagnósticos, mas também para identificar possíveis causas.

Deve considerar-se a realização de testes metabólicos, principalmente se existirem sinais típicos. Nos erros inatos do metabolismo, a espasticidade tende a ser complexa e progressiva. O rastreio metabólico tem particular importância nos casos de regressão de desenvolvimento, episódios de descompensação em períodos de maior catabolismo, atingimento multissistémico, neuroimagem sem alterações ou anomalias do globo pálido.

Outras análises adicionais devem também ser realizadas (tendo em conta que a investigação metabólica deve sempre focar-se em causas tratáveis): glicemia, CK sérica, ácido úrico, transaminases, amónia, lactato, homocisteína, aminoácidos, ácidos orgânicos, acetilcarnitinas, equilíbrio ácido-base.

O estudo genético deve ser considerado quando a PC não tem etiologia esclarecida ou quando existem características sugestivas de causa genética, nomeadamente a presença de dismorfias, consanguinidade ou a existência de antecedentes familiares. A hibridização genómica comparativa (CGH) é o exame genético de primeira linha, seguida dos painéis multigénicos de acordo com a apresentação clínica específica. A sequenciação exómica completa (WES) está reservada aos casos não esclarecidos pelos exames anteriores, particularmente naqueles com implicações reprodutivas futuras. A identificação de uma causa genética pode ter implicações nos outros membros da família e em termos de planeamento familiar.

Se história pré ou perinatal sugestiva, deve ainda considerar-se a realização de serologias do grupo TORCH.

Deve considerar-se a realização de testes metabólicos, principalmente se existirem sinais típicos. Nos erros inatos do metabolismo, a espasticidade tende a ser complexa e progressiva. O rastreio metabólico tem particular importância nos casos de regressão de desenvolvimento, episódios de descompensação em períodos de maior catabolismo, atingimento multissistémico, neuroimagem sem alterações ou anomalias do globo pálido.

Outras análises adicionais devem também ser realizadas (tendo em conta que a investigação metabólica deve sempre focar-se em causas tratáveis): glicemia, CK sérica, ácido úrico, transaminases, amónia, lactato, homocisteína, aminoácidos, ácidos orgânicos, acetilcarnitinas, equilíbrio ácido-base.

O estudo genético deve ser considerado quando a PC não tem etiologia esclarecida ou quando existem características sugestivas de causa genética, nomeadamente a presença de dismorfias, consanguinidade ou a existência de antecedentes familiares. A hibridização genómica comparativa (aCGH) é o exame genético de primeira linha, seguida dos painéis multigénicos de acordo com a apresentação clínica específica. A sequenciação exómica completa (WES) está reservada aos casos não esclarecidos pelos exames anteriores, particularmente naqueles com implicações reprodutivas futuras. A identificação de uma causa genética pode ter implicações nos outros membros da família e em termos de planeamento familiar.

Se história pré ou perinatal sugestiva, deve ainda considerar-se a realização de serologias do grupo TORCH.

A realização do estudo pró-trombótico não está indicada por rotina nas PC hemiplégicas ou com evidência imagiológica de enfarte cerebral. Contudo, nestes casos, se associadas a história familiar de trombose ou evidência de que o evento tenha ocorrido fora do período perinatal, deve ser realizado.

A realização de punção lombar (PL) não está indicada por rotina. Contudo, pode ser considerada quando há suspeita de causas raras de convulsões, como défice de GLUT1 ou distúrbios do movimento.

A ecografia transfontanelar pode ser realizada como primeira linha em lactentes com atrasos do desenvolvimento motor e em que a fontanela anterior ainda permita condições técnicas adequadas. É segura para identificar a presença de hemorragia, leucomalácia periventricular e hidrocefalia, mas não é sensível para a identificação de lesões da substância branca.

Quando detetadas anomalias através da ecografia, devem ser sempre confirmadas e melhor caracterizadas através de realização de ressonância magnética cerebral (RMN-C). A realização de RMN-C está recomendada em todos os casos em que a etiologia é desconhecida e deve ser realizada o mais precocemente possível em crianças com sinais clínicos graves ou défices motores assimétricos. Nas formas mais leves pode adiar-se a sua realização para depois dos 2 anos de idade, dado que as alterações subtis podem não se detetar quando realizada muito precocemente. A RMN-C habitualmente deteta anomalias em 85-90% das crianças com PC (lesões da substância branca, lesão dos gânglios da base ou enfartes focais). Deve considerar-se a sua repetição se existir um percurso clínico atípico, que não se enquadra no esperado para a patologia em causa.

Sempre que exista história sugestiva de convulsões, deve ser realizado um electroencefalograma (EEG)

Tratamento

O tratamento da PC é multidisciplinar e essencialmente de suporte, tendo como principal objetivo aumentar a funcionalidade dos indivíduos e maximizar a sua independência nas tarefas diárias.

As estratégias passam por melhorar o comprometimento motor, através de fisioterapia, terapia ocupacional, apoio de dispositivos ortopédicos e tratamento farmacológico da espasticidade; otimizar o tratamento das comorbilidades associadas (epilepsia, défices visuais e auditivos, refluxo gastro-esofágico, obstipação, dismotilidade gástrica, doenças respiratórias, escoliose, sialorreia, disfunção urinária, dor crónica).

É também importante a monitorização do estado nutricional e da autonomia alimentar que, quando comprometidas, condicionem a ponderação de eventual necessidade de gastrostomia.

O recurso a cirurgia ortopédica é uma necessidade frequente.

Saber Mais

Glossário

PC espástica – caracteriza-se por hipertonia, hiperreflexia, sinais extrapiramidais e clónus; estas crianças habitualmente apresentam movimentos lentos, dificuldades na motricidade fina e fadiga. Classifica-se em unilateral ou bilateral, esta última que por sua vez, se subdivide consoante o atingimento em: 2 membros/3 membros/ 4 membros afetados.

PC discinética – caracteriza-se essencialmente, pela presença de movimentos involuntários, descontrolados, recorrentes, ocasionalmente estereotipados, com tónus muscular variável e predomínio de reflexos primitivos. Subdivide-se em 2 grupos: a forma de coreoatetose ou a distonia.

PC atáxica - é o subtipo mais raro e na presença deste devem sempre ser excluídas outras doenças neurodegenerativas; caracteriza-se por falha na coordenação muscular, associada a diminuição do tónus, com ataxia do tronco e marcha, dismetria e tremor.

Bibliografia

  1. Lourenço L, Campos T, Rodrigues E, Sousa R, Guardiano M, Leão M, Protocolo para la investigación etiológica de la parálisis cerebral. Revista de Neurología. 2019 Dec 16;69(12):512-513.
  2. Novak I, Morgan C, Adde L, et al. Early, Accurate Diagnosis and Early Intervention in Cerebral Palsy: Advances in Diagnosis and Treatment. JAMA Pediatr 2017; 171:897.
  3. Smithers-Sheedy H, Badaw N, Blair E, Cans C, Himmelmann K, Krägeloh-Mann I, et al. What constitutes cerebral palsy in the twenty-first century?. Dev Med Child Neurol. 2014; 56: 323-8.
  4. Glader L, Barkoudah W. Cerebral palsy: evaluation and diagnosis. UpToDate 2020. URL: https://www.uptodate.com/contents/cerebral-palsy-evaluation-and-diagnos….
  5. Virella D, Folha T, Andrada MG, Cadete A, Gouveia R, Alvarelhão J, Calado E. Vigilância Nacional da Paralisia Cerebral aos 5 anos de Idade - Crianças Nascidas entre 2001 e 2007. Federação das Associações Portuguesas de Paralisia Cerebral. 2017.

Deseja sugerir alguma alteração para este tema?
Existe algum tema que queira ver na Pedipedia - Enciclopédia Online?

Envie as suas sugestões

Newsletter

Receba notícias da Pedipedia - Enciclopédia Online no seu e-mail