Bulimia
Introdução
Distúrbio do comportamento alimentar caracterizado pela ocorrência, em média pelo menos uma vez por semana durante 3 meses, de episódios recorrentes de compulsão alimentar, associados a uma sensação de falta de controlo e comportamentos compensatórios inapropriados recorrentes para evitar o aumento ponderal, como vómitos auto-induzidos, uso indevido de laxantes ou diuréticos, jejum ou exercício excessivo.
Estes episódios não ocorrem exclusivamente durante episódios de anorexia nervosa.
Epidemiologia
A prevalência estimada de distúrbios alimentares em adolescentes é de aproximadamente 13%, sendo que 0,8–2,6% correspondem a bulimia.
História Clínica
Anamnese
Os adolescentes podem expressar comentários acerca de se sentirem “gordos” ou não gostarem da sua imagem corporal.
É frequente organizarem horários complexos para acomodar os episódios de compulsão alimentar e purgativos, frequentemente acompanhados de deslocações frequentes à casa de banho. Os períodos com ingestão compulsiva são frequentemente precedidos ou seguidos por períodos de restrição da ingestão.
Os comportamentos compensatórios podem incluir além dos vómitos, exercício excessivo, abuso de laxantes ou diuréticos. A utilização abusiva de laxantes pode conduzir ao surgimento de hemorróidas ou prolapso rectal.
O adolescente pode expressar sentimentos de vergonha por não conseguir manter um peso baixo, apesar do forte impulso cognitivo para o fazer.
É importante manter em mente que mais de metade dos doentes com distúrbios alimentares cumpre critérios para um episódio, actual ou passado, depressivo.
Exame objectivo
O primeiro passo da avaliação destes doentes passa pela avaliação do peso corporal, da altura e o cálculo do Índice de Massa Corporal (IMC). Os adolescentes com bulimia, ao contrário dos com anorexia, não apresentam geralmente perdas significativas de peso, traduzindo-se antes por flutuações do peso.
Apesar dos mecanismos compensatórios, geralmente têm um peso normal ou até excesso de peso. É importante ter em conta que o peso não têm correlação com o grau de severidade da doença.
Ao exame objectivo podem ser notadas manchas nos dentes, áreas de erosão do esmalte ou problemas gengivais, resultado da indução frequente do vómito.
Podem ainda ocorrer episódios frequentes de parotidites, resultantes da inflamação provocada pela passagem de ácidos e enzimas durante o vómito.
Os adolescentes podem apresentar-se com edemas, decorrentes dos distúrbios electrolíticos subsequentes, da hipoproteinúria ou do uso abusivo dos laxantes.
Um sinal bastante sugestivo da indução frequente do vómito é o sinal de Russel, que se caracteriza pela existência de cicatrizes ou calosidades nas articulações metacarpofalângicas ou no dorso da mão.
Diagnóstico Diferencial
Fazem parte do diagnóstico diferencial:
- Obesidade
- Anorexia Nervosa
- Distúrbios Obsessivos Compulsivos
- Transtorno Dismórfico Corporal
- Insulinoma
- Tumores do hipotálamo
- Síndrome de Prader-Willi
Exames Complementares
A realizar numa primeira fase:
Patologia Clínica
- hemograma completo,
- bioquímica,
- estudo da coagulação,
- metabolismo do Ferro (ferritina e proteína C reactiva),
- urina tipo II,
- painel metabólico completo,
- doseamento da amilase,
- lipase,
- fósforo e magnésio,
- função tiroideia.
Eletrocardiograma
Imagiologia
A realização da densitometria óssea pode ser deferida para uma segunda fase de avaliação, sendo contudo importante, principalmente nos casos com evolução mais longa.Tratamento
Tratamento em Ambulatório:
Aconselhamento nutricional:
A orientação nutricional deve concentrar-se na ingestão de alimentos saudáveis e na recuperação da energia necessária para retomar as actividades diárias. Os menus diários devem incluir três refeições completas e um cronograma estruturado de lanches que deve ser monitorizado pelos pais.
Psicoterapia:
É a fundação para um tratamento bem sucedido. Diversos estudos demonstraram uma melhoria significativa em doentes com bulimia com a terapia cognitivo-comportamental e interpessoal. Os objectivos devem incluir a alteração da distorção da imagem corporal e de hábitos alimentares disfuncionais, assim como o retorno às actividades sociais e actividades físicas completas. Não esquecer que os membros da família podem precisar de apoio e ajuda para aprender a cuidar do doente.
Terapêutica Farmacológica:
Vários estudos sugerem um benefício da utilização de Inibidores da Recaptação da Serotonina com uma diminuição da frequência dos comportamentos compulsivos e purgativos. Nesse sentido, a utilização destes pode ser necessária em doentes com ausência de resposta à psicoterapia ou com sintomas depressivos associados.
Internamento quando necessário:
Em casos graves pode existir necessidade de internamento. São critérios para hospitlização:
- Anormalidades eletrolíticas significativas
- Arritmia ou bradicardia severa
- Esofagite ou ruptura esofágica
- Hematemeses
- Hipotermia
- Vómitos intratáveis
- Síncopes
- Comorbilidades médicas ou psiquiátricas graves, incluindo ideação suicida
- Ausência de resposta ao tratamento em ambulatório
Evolução
Até 80% dos doentes atingem a remissão com o tratamento apropriado. Contudo, a taxa de recidiva de é de cerca de 20%, o que representa um desafio significativo.
Além disso, a bulimia encontra-se associada a um aumento da taxa de mortalidade padronizada por todas as causas de 1,6 a 1,9%.
Saber Mais
Bibliografia
- Harrington B.C, Haxon C., Jimerson D.C. Initial Evaluation, Diagnosis, and Treatment of Anorexia Nervosa and Bulimia Nervosa. Am Fam Physician. 2015; 91(1): 46-52.
- Mairs R., Nicholls D. Assessment and treatment of eating disorders in children and adolescents. Arch Dis Child 2016;101:1168–1175
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