Mastalgia
Introdução
Definição
Mastalgia define-se como dor mamária.
Epidemiologia
É o sintoma mamário mais comum e é mais frequente no sexo feminino. Cerca de 40% das adolescentes refere mastalgia e 70% das mulheres refere pelo menos um episódio ao longo da vida.(1,2) O impacto dos sintomas nas atividades diárias nesta faixa etária é desconhecida. Estudos realizados na população em geral revelam interferência com a vida sexual (48%), com o sono (35%), com a atividade social (13%) e com a atividade laboral/escolar (8%). A idade e o tamanho da mama relacionam-se diretamente com a dor, enquanto os níveis de preparação e atividade físicas apresentam uma relação inversa.(1)
História Clínica
A história clínica deve abordar as seguintes questões-chave (2–4):
Anamnese
- Classificação da dor
- Relação com o ciclo menstrual
- Constante ou intermitente
- Localização – Uni ou bilateral, focal ou generalizada, irradiação
- Interferência com as actividades de vida diárias;
- Factores desencadeantes (por exemplo, actividade física com impacto no tronco e membros superiores);
- Sintomas associados (febre, arrepios, alterações cutâneas, massa palpável, corrimento mamilar);
- Gravidez ou aleitamento recentes;
- Traumatismo;
- Alteração ponderal (perda ou ganho de >5Kg num ano podem estar associados a mastalgia).
Antecedentes pessoais
- Antecedentes ginecológicos/obstétricos – Telarca, menarca, características dos ciclos menstruais e data da última menstruação; número de gestações e partos; amamentação e eventuais complicações
- Antecedentes de patologia ou cirurgia mamária
- Antecedentes de cancro e/ou irradiação torácica
- Comorbilidades associadas a um maior risco de infecção (imunossupressão, diabetes mellitus)
- Medicação habitual
- Medicação hormonal (estrogénios, progestativos, estroprogestativos)
- Antidepressivos e antipsicóticos (Inibidores selectivos da recaptação da serotonina, venlafaxina, mirtazapina, haloperidol e antipsicóticos fenotiazínicos)
- Antihipertensores (metildopa, espironolactona, minoxidil)
- Outros (ciclosporina, derivados das prostaglandinas, domperidona, penicilamina)
- Hábitos – Cafeína, tabagismo, drogas (marijuana)
Antecedentes familiares
Antecedentes familiares de cancro da mama são causa de grande ansiedade em jovens com mastalgia.
Exame objectivo
Na ausência de supressão do eixo hipotálamo-hipófise-ovário, o exame mamário deve ser realizado idealmente no período de menor influência hormonal, ou seja, cerca de 7 a 9 dias após o início da menstruação.
Inspecção:
Deve iniciar-se com a doente sentada, com o soutien vestido, de forma a avaliar a adaptação do soutien, examinando as marcas do mesmo a nível dos ombros e região torácica.
Após remoção do soutien, avaliar o estadio de Tanner e a sua adequação à fase de desenvolvimento pubertário, o tamanho da mama, alterações cutâneas, assimetrias e alterações mamilares.
Palpação:
A palpação deve realizar-se com a doente sentada, e, posteriormente, em decúbito dorsal com os braços elevados atrás da nuca. O exame deve avaliar os quatro quadrantes, o complexo aréola-mamilar, o prolongamento axilar, a axila e os escavados supra e infra-claviculares.
Para excluir dor com origem na grelha torácica poderá ser útil pedir à doente para se sentar com o tronco fletido sobre as coxas ou para se posicionar em decúbito lateral com o objectivo de afastar o tecido mamário da grelha costal possibilitando a sua palpação.(3)
Diagnóstico Diferencial
- Mastalgia cíclica – É a causa mais frequente (2/3). Define-se como dor de intensidade superior a 4/10 com duração de 5-7 dias na semana que antecede a menstruação.(4) Relaciona-se com uma hipersensibilidade às alterações fisiológicas do ciclo menstrual e é tipicamente bilateral e simétrica, envolvendo preferencialmente os quadrantes supero-externos. O início de contracepção hormonal combinada (CHC) pode associar-se a um agravamento, embora habitualmente resolva com a continuidade do tratamento. Alterações fibroquísticas da mama podem causar dor cíclica.(2)
- Mastalgia não-cíclica – Não se relaciona com o ciclo menstrual, é frequentemente unilateral e de localização variável.
Origem mamária
- Quistos – Quistos sob tensão ou com inflamação podem causar dor, habitualmente unilateral, focal e de início agudo. As alterações fibroquísticas podem também ser causa de dor não-cíclica.(3)
- Fibroadenomas gigantes juvenis – Os fibroadenomas juvenis são habitualmente assintomáticos embora possam causar desconforto pré-menstrual. O fibroadenoma gigante juvenil consiste num caso particular, de aparecimento súbito e de crescimento rápido, atingindo dimensões > 5 cm. A dor deve-se ao estiramento cutâneo e pressão sobre o tecido mamário.(3,4)
- Ectasia ductal – Deve-se à dilatação inflamatória dos ductos subareolares e pode estar associada a febre e mastalgia de início agudo, unilateral e localizada. O grau de dilatação relaciona-se com a dor.(3)
- Mamas grandes, em pêndulo – Podem causar dor por estiramento dos ligamentos de Cooper.
- Traumatismo prévio – Episódios de traumatismo, cirúrgico ou não, podem cursar com hematoma ou necrose gorda causando dor persistente após o evento. Uma entidade particular, a doença de Mondor, consiste numa tromboflebite superficial, habitualmente após traumatismo ou cirurgia mamários e caracteriza-se pela presença de um cordão doloroso e endurecido entre as regiões epigástrica e axilar.(3)
- Mastite e abcesso mamário – A dor é habitualmente unilateral e localizada, associada a sinais inflamatórios locais e febre, associada ou não a corrimento mamilar purulento.
- Cancro – A sua incidência nesta faixa etária é baixa e raramente se apresenta com mastalgia. Esta hipótese deve ser colocada em jovens com outras neoplasias e antecedentes de irradiação torácica. (5)
- Outros – Gravidez, inflamação de tubérculos de Montgomery, fármacos, marijuana. (2,3)
Origem extramamária (nevralgia intercostal, radiculopatia, causas musculares, Síndrome de Tietze, herpes zoster, patologia biliar, pulmonar, cardíaca ou esofágica, etiologia psicogénica).
Exames Complementares
Patologia Clínica
Hemograma
- Na suspeita de mastite/abcesso mamário em lactentes
Microbiologia
- Hemoculturas
Em todos os casos de suspeita de mastite/abcesso mamário em lactentes
- Cultura do corrimento mamilar e do conteúdo de drenagem de abcesso
Imagiologia (2)
Massa palpável ao exame físico: Ecografia mamária.
Ausência de alterações ao exame físico:
- Mastalgia cíclica – Não são necessários exames de imagem. Poderá ser solicitada uma ecografia mamária para tranquilizar a jovem e/ou a família.
- Mastalgia não cíclica
- Difusa – Ecografia mamária (para exclusão de causa patológica e tranquilização).
- Focal – Ecografia mamária.
A mamografia não é o exame de primeira nesta faixa etária uma vez que o predomínio de tecido glandular dificulta a interpretação do exame. A sua indicação está reservada para os casos de lesões suspeitas detectadas na ecografia.(5)
Histologia
Fibroadenomas gigantes juvenis – A biópsia está indicada para confirmar o diagnóstico.
Quistos – Poderá estar indicada biópsia nos casos de citologias inconclusivas ou de atipia.
Tratamento
Medidas comportamentais
O tratamento de qualquer tipo de mastalgia de origem mamária começa pela tranquilização. A exclusão de patologia maligna e a explicação de que se trata de um processo benigno melhora o quadro em 85% das doentes. (4)
A escolha de um soutien de suporte adequado e a prática regular de exercício contribuem também para o alívio da dor, tal como a aplicação de compressas quentes e gelo na fase aguda. (3,4)
A relação da dieta e do tabaco com a mastalgia é controversa. A evicção de cafeína e nicotina parece resultar numa melhoria da dor. No entanto, esta poderá dever-se a um efeito placebo.(2,3)
Nos casos de mastalgia cíclica, poderá ser útil um diário com registo dos episódios de dor. (4)
Tratamento farmacológico
Analgesia
Analgésicos como a paracetamol ou um AINE oral ou tópico melhoram a mastalgia cíclica e não cíclica.(4)
Contraceptivos hormonais combinados
Quando a dor surge associada à toma de contraceptivos hormonais combinados (CHC), habitualmente resolve nos primeiros 3 a 6 meses de tratamento. Quando tal não acontece, a redução da dose de etinilestradiol, a alteração do progestativo ou a mudança de método ou da via de administração são opções válidas. O papel dos CHC na causa ou alívio da mastalgia cíclica permanece por esclarecer.(4)
Fármacos como a bromocriptina, o danazol ou o tamoxifeno são eficazes no tratamento da mastalgia cíclica grave em mulheres adultas. No entanto, não foram estudados em idade pediátrica.(3)
Antibioterapia
Está indicada nos casos de mastite/abcesso mamário.
Lactentes
Crianças e adolescentes – Na ausência de sintomas sistémicos, a antibioterapia poderá ser iniciada por via oral com cobertura para S. aureus (Flucloxacilina na ausência de suspeita de MRSA; Clindamicina ou Vancomicina em caso de suspeita de MRSA).
Cirurgia
Quistos – Nos casos de quistos volumosos, com sinais inflamatórios recorrentes e/ou em caso de ansiedade da doente, poderá realizar-se uma citologia aspirativa sob controlo ecográfico. No entanto, deve ser referido o risco de recorrência de 10-20% mesmo após aspiração completa. A exérese cirúrgica raramente é necessária nesta faixa etária. No entanto, poderá estar indicada nos casos de quistos complexos, com infecções recorrentes e/ou recidivantes. (4)
Fibroadenomas gigantes juvenis – A exérese cirúrgica está sempre indicada.(5)
Abcesso refractário a antibioterapia – Drenagem cirúrgica.(5)
Ectasia ductal – A exérese cirúrgica do ducto afectado poderá estar indicada nos casos de sintomas persistentes ou recorrentes.(4)
Algoritmo clínico/terapêutico
AINE – Anti-inflamatório não esteroide
CHC – Contracepção oral combinada
Evolução
O prognóstico varia consoante a idade de início da dor e a ciclicidade. O início em idades mais jovens está associado a uma maior persistência dos sintomas. Na mastalgia cíclica, a resolução espontânea ao fim de 3 meses ocorre em 20-30% das doentes. No entanto, as recidivas são comuns. Nos casos de mastalgia não-cíclica, o prognóstico depende da identificação e tratamento da causa subjacente. É importante tranquilizar a doente e a família explicando que as doenças malignas primárias da mama são raras nesta faixa etária e raramente se acompanham de dor.(5)
Bibliografia
- Scurr J, Hedger W, Morris P, Brown N. The prevalence, severity, and impact of breast pain in the general population. Breast J. 2014;20(5):508–13.
- Balleyguier C, Arfi-Rouche J, Haddag L, Canale S, Delaloge S, Dromain C. Breast pain and imaging. Diagn Interv Imaging. 2015;96(10):1009–16.
- Onstad M, Stuckey A. Benign Breast Disorders. Obstet Gynecol Clin North Am. 2013;40(3):459–73.
- Perou CM. Manual de Práctica Clínica en Senología. 3 ed. Fundación Española de Senología y Patología Mamaria. 2015.
-
Jones KN. Imaging of the adolescent breast. Semin Plast Surg. 2013;27(1):29–35.
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